Data: 15/02/2007 - Íntegra do discurso do governador na abertura dos trabalhos da Assembléia Legislativa - 15/02/2007 18:14:45
Antes de tudo, os cumprimentos do Governo do Paraná à Assembléia por esta nova Legislatura, a l6ª de sua História. Que este novo período de trabalho seja pleno de iniciativas em favor do nosso povo. Que seja uma Legislatura fértil, inventiva, criadora. E que os Poderes Executivo e Legislativo estabeleçam parcerias produtivas, tendo como norte o bem-estar da nossa gente.
Os cumprimentos do Governo do Paraná à nova direção da Casa. Vejo na Mesa tantos amigos, companheiros fraternais, mas é como Poderes que vamos nos relacionar, de forma respeitosa, conformes aos preceitos republicanos.
Os cumprimentos do Governo do Paraná aos novos deputados, às senhoras e senhores que começam agora a exercer o primeiro mandato. Bem vindos. É um novo sopro nesta Casa de tantas tradições.
Uma saudação especial às senhoras deputadas. A presença aqui da Bete Pavin, da Luciana Rafagnin, da Cida Borghetti, da Rosane Ribas é uma garantia a mais de debates serenos, aprofundados, sensíveis. À política, aos negócios do Estado não podem faltar a percepção feminina, o olhar diferenciado, agudo e afetuoso da mulher.
Senhoras e Senhores Deputados.
Em meu discurso de posse, não deixei qualquer dúvida quanto às opções, as escolhas de nosso governo. De que lado estamos, para quem governamos. Hoje, na mensagem que trago à Assembléia, no início do ano legislativo, reafirmo os compromissos assumidos.
Tudo que planejamos executar nos próximos quatro anos tem como princípio, meio e fim os interesses do nosso povo, dos trabalhadores, da nossa gente mais humilde. Eles vão ser a medida das nossas ações.
Portanto, nesta mensagem não se registram compromissos com o mercado, com o balanço das corporações, com os resultados financeiros da especulação, com as cotações das Bolsas, com os contratos lesivos ao interesse público.
Assim, talvez alguns vejam mais razões para que o mercado fique nervoso, inquieto, impaciente com o Governo do Paraná, com as opções feitas pelo Governo do Paraná. Que se agitem, que se irritem, que se abespinhem. Pouco se me dá.
Nas semanas seguintes à minha posse, ao discurso de posse, gastaram muita tinta, amontoaram milhares de caracteres em jornais, revistas e na internet, alguns ficaram com voz roufenha no rádio, outros gesticularam nas TVs, a oposição foi à tribuna, consultaram os especialistas e consultados os especialistas pronunciaram com acuidade do conselheiro Acácio, todos tentando, de alguma forma, desmerecer a nossa profissão de fé como governo de esquerda.
Nunca li e tampouco ouvi tanta bobagem. Um dos tantos especialistas consultados disse que era impossível um governo de esquerda porque ainda vivíamos sob um regime capitalista. Outro disse que um governo de esquerda só poderia ser fruto de um processo revolucionário emergido do embate da luta de classes.
Houve, é claro, os inevitáveis citadores de Marx, mais para Groucho ou Chico ou Harpo do que para Karl.
Somos, sim, um governo de esquerda. Segundo a tradição humanista. Recolhendo do iluminismo, dos enciclopedistas, dos utópicos, dos primeiros socialistas, dos marxistas, das encíclicas papais e dos ensinamentos evangélicos as lições da solidariedade, do amor ao próximo, da fraternidade, da construção de um mundo sem explorados e sem exploradores.
Em uma frase, em uma sentença, Aristóteles, há tantos milênios, sintetizou o sentido da civilização que o homem então começava a construir. Sua sentença: Ántropos Estín Zôo Politikôn. Isto é, o homem é um animal político. Quer dizer, gregário, solidário, cuja existência e sobrevivência dependem de sua capacidade de irmanar-se, ajudar-se, crescer e avançar juntos.
Isso é esquerda. Porque a esquerda é a civilização. Justo o oposto do individualismo, da desigualdade, da exclusão, da competição predatória, da esperteza, da ascensão a qualquer preço, das razões do lobo, de levar vantagem em tudo, do lucro produzido sobre a miséria dos trabalhadores e das nações.
Na semana passada, a imprensa deu grande destaque a recentes relatórios sobre a predação do meio ambiente. A irresponsável e nefasta intervenção do homem no espaço que nos foi dado a viver.
Não se fala mais que o perigo está séculos e séculos adiante. Algo remoto ou mesmo improvável, uma hipótese. Não. Trabalhamos hoje com o horizonte de cinqüenta anos, não mais que isso, para que grandes desastres ambientais possam acontecer.
O aquecimento global e suas conseqüências apocalípticas estão ao alcance de nossas mãos.
Diante disso, depois disso, não há como deixar de se fazer uma clara, apaixonada e vibrante opção pela esquerda.
Os conservadores, os globalizantes, os dito liberais e neoliberais, a direita enfim, desdenham o perigo. Se não rejeitam o Protocolo de Kyoto com a franqueza bruta e tosca de um Bush, buscam conciliar a destruição com piedosas concessões à vida.
E o que se vê é a contradição absoluta, inconciliável, entre a expansão do capitalismo imperial e a manutenção de uma terra saudável, habitável, acolhedora, maternal.
Não existe compatibilidade entre a perseguição obsessiva e irrefreável pelo lucro, a formação dos ciclópicos, colossais conglomerados transnacionais, devoradores insaciáveis de matérias-primas, de energia, de florestas, de rios, de mares, de consciências, de vidas, de soberania dos povos, de autonomia das nações e a sobrevivência do homem no planeta Terra.
Como diriam os marxistas – e os marxistas têm razão – trata-se de uma contradição fundamental, que se resolve com a prevalência de um dos pólos em choque.
Einstein dizia que é altamente provável que o homem seja mortal. Afinal, até agora, ele morreu. Que a nossa mortalidade, tão inevitável, não nos torne insensíveis diante do desastre provável. Que não sejamos cínicos, desumanos ao ponto de dar de ombros às coisas terríveis que se prenunciam.
A fantástica aventura do homem sobre a Terra, que tantas maravilhas produziu, não pode findar de maneira tão medíocre afundando-se na poluição, favelizando-se nas cidades, na destruição das florestas, na extinção da fauna, na desertificação, no desaparecimento do rios, na sede, na fome.
Tudo que a arte e o engenho humano criaram, produziram, e perpetuaram vê-se de repente ameaçado pelo alarido insano dos pregões das Bolsas.
É o tropel dos novos Átilas. É a barbárie, a grosseria, a crueldade, a selvageria, o atraso, a incultura, a bruteza atropelando a civilização. É a mediocridade da troca da progenitura pelo prato de lentilhas.
O poeta sírio Ali Ahmad Said, refletindo sobre a crise que ensangüenta o Oriente Médio, disse que um povo pode ser declarado extinto quando perde a capacidade de mudar o mundo. Isso vale para todo o mundo. Isso vale para nós. Ou mudamos, ou renunciamos ao futuro, ao direito ao futuro.
A mudança é a esquerda. Ideais tão caros como a igualdade, a fraternidade, a liberdade, a convivência harmoniosa dos homens entre si e com a natureza que os cerca, a generosa utopia de um mundo sem exploradores e sem explorados são os antídotos certeiros contra a destruição do planeta.
O respeito ao meio ambiente não se dissocia, pelo contrário, completa-se com o respeito dos homens uns pelos outros. O respeito ao trabalhador, a solidariedade aos nossos irmãos mais pobres, a promoção dos excluídos, trazendo-os de volta às possibilidades da vida, a educação, a nutrição, a saúde, a segurança, a moradia, todo esse conjunto de ações compatibilizam-se, são um prolongamento da convivência harmoniosa com o meio que nos cerca.
A tacanhez, a pequenez, a miopia de alguns, da nossa mídia, dos tais analistas políticos e econômicos, esses comentaristas dos bons-dias, impede-os de ver outro mundo além das Bolsas, do jogo do mercado, das transnacionais, da globalização.
Por mais que trombeteiem os sinais de alerta, essa gente permanece surda às evidências.
Dias desses, sem nenhum destaque, sem nenhum comentário dos especialistas, mesmo que acacianos, a ONU divulgou novo estudo sobre a globalização e reafirmou as conclusões anteriores. Quanto mais avança a globalização, quanto mais desregulamenta-se a economia dos países periféricos, quanto mais se flexibilizam as legislações trabalhistas e ambientais, quanto mais se privatizam empresas nesse terceiro mundo, fim de mundo, maior a miséria dos nossos povos.
Quer dizer, existe uma relação direta entre o avanço da globalização e o avanço da pobreza.
Alguma novidade? Nenhuma. Afinal, alguém acreditou que a globalização fosse feita para aumentar o ganho dos trabalhadores, melhorar suas condições de vida, dar-lhes dignidade e felicidade?
Por isso, resistir é preciso. E aqui no Paraná, na medida das possibilidades, sob as limitações que se nos impõem, resistimos.
Esta é a mensagem que trago às senhoras e aos senhores deputados. Esta é a mensagem ao povo do Paraná. Temos um lado, temos uma posição, temos um norte. E vamos governar segundo essa orientação.
Um governo de esquerda sim. Sem medo das posições que assume, radicalizado na opção feita e confiante nas mudanças que pode estimular e realizar.
O homem ao longo do processo civilizatório sempre sonhou com um mundo assim. Harmonioso, solidário, avançado, com os frutos do trabalho e do progresso repartidos irmamente.
Na busca dessa aspiração tão magnânima, tão grandiosa e sublime, tão ardente consumiram-se vidas, projetos de vida, avançou e recuou a História. Ensaiaram-se revoluções, frustraram-se revoluções.
Foram-se tantas vidas, tantas aflições, tanta doação, tantos sacrifícios, tantas cruzes e patíbulos que se ergueram que nem mesmo o advento absoluto de um mundo pleno do sol da liberdade, radiante de fraternidade e harmonioso como foi concebido o Éden haverá de redimir os que morreram para essa construção. E os que ainda vão morrer e sofrer para que isso aconteça.
Mas vale a pena lutar, mas vale a pena governar. À esquerda, que esta é a nossa direção.
segunda-feira, 31 de agosto de 2009
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