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terça-feira, 14 de junho de 2011

Roberto Balico escreve...

O sofrimento do Zé.




O Zé, homem do campo, simples, campeiro analfabeto, construiu sua vida
e sustentou seus filhos no sol escaldante do dia a dia, munido de foice, machado e enxada.
Naquele tempo, na década de 50, ninguém sobrevivia no campo se não tivesse
vontade para trabalhar e muita coragem para sobreviver diante de tantas adversidades.
As matas eram inóspitas. A onça rondava os barracos e os mosquitos comiam o
homem vivo.
O Zé, para suportar os insetos, começou a fumar com apenas 11 anos de idade.
Assim e com a crendice popular de que com 3 noz em sua camisa bate-seca,
conseguia se livrar dos bichos e afastar as cobras.
Foram anos de muito sacrifício para tornar seu pequeno sitio em um local próspero e
produtivo para sustentar sua prole.
Naquele tempo o agricultor que tinha mato em sua propriedade era considerado
vagabundo por parte do governo, que sobretaxava tais áreas e as considerava improdutivas.
Assim o Zé, que não era vagabundo nem coisa do gênero, derrubou todas as árvores
para plantar alimentos e criar animais, começando pelas nascentes, Afinal, naquela época
não existia energia elétrica e a água para uso pessoal e dos animais era transportada
diretamente da mina com baldes.
Deste modo, ele construiu um barraco de palmito lascado para sua família morar.
Também construiu um pequeno chiqueiro para criar porcos, um potreiro para criar umas
vaquinhas de leite um galinheiro para ter ovos e carne do bicho para o gasto e ainda uma
horta para alimentar a família.
Os anos foram passando, o Zé foi prosperando e os valores, não os dele, foram se
invertendo na mesma proporção.
Hoje, após 50 anos, o Zé tá velho, cansado, mas orgulhoso por ter construído a
propriedade de seus sonhos, um modelo para muitos.
Hoje ele tem 20 cabeças de gado holandês e uma leiteria com máquinas modernas;
Tem um chiqueiro de porco com capacidade para 500 cabeças;
Tem um aviário com 12.000 frangos;
Tem várias represas para criação de peixes;
Tem uma terra fértil e produtiva, pois se utiliza das técnicas mais modernas de
conservação de solo, rotação de cultura, adubação orgânica e plantio direto.
Por mais que sua terra esteja entre uma das melhores e mais produtivas do Estado e
do país, ele hoje é considerado um fora da lei, pois não possui reserva legal exigida pelas
leis ambientais. Não bastasse isso, possui construções na área de preservação permanente.
Certo dia o Zé estava cortando uma árvore que havia caído devido aos ventos fortes
que ocorreram na região. O nhô xico, vizinho fracassado e invejoso, denunciou o Zé para
o IAP, que lhe notificou por várias irregularidades, dentre elas: cortar uma peroba – árvore
em extinção; por não ter tratamento dos dejetos de seus animais; por suas vacas tomarem
água no rio; por ter sua residência e galpões dos animais muito próximos a nascente, e,
além disso, por construir tanques para criar peixes e sua horta em área de preservação
permanente.
O Zé com uma tristeza profunda no coração, principalmente por ser um caboclo
com o coro surrado pelo sol escaldante do dia a dia e ainda por ter enfrentado 3 secas
consecutivas e perdido toda a sua produção de soja e milho, não viu outra alternativa e
vendeu os animais para pagar as multas que lhe foram impostas.
Alugou uma casa na cidade. Parou de criar peixes, de plantar na horta e arrancou

a casa e os galpões do lugar que estavam a mais de 40 anos para reconstruí-las após a
colheita da safra de verão.
Para sua surpresa perdeu mais uma safra devido à longa estiagem que se instalou no
Paraná nos últimos anos. Assim, não conseguiu reconstruir as benfeitorias como exigia os
órgãos ambientais.
Pressionado pelo banco para pagar as dividas, vendeu o sitio para o fazendeiro mais
próximo e mudou-se para a cidade grande com sua família.
Na metrópole, o Zé procurou as autoridades e disse: “vim me desculpar com os
senhores por ter sido um mau cidadão durante toda a minha vida. Sempre pensei que eu
fosse um herói por ter sustentado minha família diante de tantas dificuldades. Também
pensei que por ajudar na produção de alimentos para os senhores que moram nos grandes
centros eu deveria ter meus méritos; por ter suportado todas as adversidades para manter a
posse das terras do Brasil na faixa de fronteira do mesmo modo pensei que eu deveria ter a
minha valoração. Mas não tive, pois degradei o meio ambiente, arranquei árvores, permiti
que meus animais poluíssem as águas e hoje me arrependo por tudo o que fiz de mau ao
meu país e aos senhores da capital. Por isso, vim para cá com o objetivo de me redimir,
pois diziam que aqui vocês não poluíam.
Infelizmente não foi bem isso que vi aqui. Para minha surpresa, entendi que os
senhores é que são os verdadeiros poluidores.
Lá no sitio jogávamos as fezes dos porcos para tratar os peixes e os senhores diziam
que era errado, mas aqui vocês jogam suas fezes e seu lixo nas nascentes onde é captada
a água que todos bebem e pelos senhores é considerado certo; suas indústrias e seus
carros potentes poluem nosso ar com uma fumaça negra, e, além de não preservarem as
matas ciliares, como exigem de nós do campo, os senhores entopem o leito dos rios com
plásticos, garrafas e todo tipo de porcaria.
Os senhores, que sabem tudo sobre todos, me respondam: e agora, para onde vou com
minha família?”




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