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sábado, 18 de janeiro de 2014

Intimo e público.


Íntimo e público.


Íntimo é o que está muito dentro, que atua no interior, é o que diz respeito ao âmago, ao imo. De íntimo vem o conceito de intimidade, que é a qualidade do que é íntimo, no sentido de vida íntima, do particular. Opõe-se assim, ao que é público.
Público é o que é destinado ao público, que é de uso comum, de todos, que se realiza em público. Assim entende-se que dar publicidade é exercer ação psicológica, dar a público. Pode-se dizer que o público é feito em público. O Conceito vem de publicar, ou seja, dar publicidade, vulgarizar, tornar vulgar.
Já fui adolescente, arteiro, voraz de afirmação, talvez por isto sinto-me capaz de denunciar uma falha, que naqueles anos adolescentes era uma exceção e hoje se faz regra. Uma falha na educação que se esqueceu de dar-me o devido conhecimento justamente naqueles preciosos anos, quando ainda desabrochava a sensualidade e formava-se o caráter, de que havia profundas diferenças entre o que é íntimo e o que é público.
Assim, roubar ou receber um beijo, na minha geração, era ato, salvo raras exceções, de muita intimidade. Por via da publicidade "libertária" dos anos 50, tornava-se, cada vez mais, um meio de obter a aprovação e o sentimento de pertença ao grupo pelo testemunho ocular dos outros. Fazia- se assim, aos poucos, ser o íntimo sentimento... Menos saboroso e mais publicitário.
Hoje, chego a duvidar se ainda se conserva o conceito de intimidade nas relações afetivas. Não que eu esteja pregando um retorno ao romantismo dos anos passados, mas ao observar friamente o comportamento sexual-publicitário dos jovens, vejo vulgarizadas, as suas mais belas proposições do amor e do sexo.
Vê-los em plena rua, dentro dos automóveis como se fossem peixes em aquário, nas portas das escolas, nos cinemas, nos teatros, dando publicidade de suas relações mais íntimas, denunciando que fazem questão de parecer público o que lhes é mais íntimo. Acredito que é isto o que hes rouba da consciência o amor, e faz de todos eles, objetos de domínio público, vitimas das paixões, dos vícios e da ância de um prazer vazio. Animais no cio.
Aos olhos de outros rapazes e moças, aquelas e aqueles, mais particularmente, aqueles e aquelas que praticam alguma promiscuidade na freqüente troca dos casais, vão adquirindo sem perceber a fama "galinácea". Chamados de "galinhas" como se diz na gíria, dão assim testemunho da inconstância dos sentimentos, do exemplo do amarrotar público das roupas, dos cabelos e da alma, do despir-se da vergonha, do tornarem-se vulgar na mais precisa acepção da palavra.
Ver e participar, coadjuvando de algum modo, como se fossem eles estímulos públicos à sensualidade alheia, num estreito e prolongado exibir-se, faz da relação íntima um vazio, um exteriorizar-se, uma propaganda apenas.
Não creio que o rapaz perceba que esta a "vender" por meios publicitários a impudicia de sua companheira, desrespeitando-a. O mesmo sucede à moça.
Não creio que sinta sem cicatrizes o aproximar-se de terceiros, que de algum modo, por terem participado de suas "intimidades" do casal, e justamente por isto, sentem-se assim autorizados, como quem de um filme participa, criando "folgas" e "ïntimidades" fantasiosas, tendo como objeto os "atores" de públicas e patéticas cenas.
Não sem cicatrizes, um jovem verá sua companheira ou companheiro partir, sem ao menos chegar a perceber que colaborou na "venda" da companheira ou companheiro. Na sua vulgarização.
É com tristeza que vejo a sociedade despir-se, como se despem seus cidadãos adolescentes, se é que podemos chamá-los assim, e nus de seus escrúpulos, trocam o ouro da intimidade humana por bijuterias da publicidade.
Despem-se, com velocidade cada vez mais crescente, das roupas do tecido social, sem se aperceberem da fina e delicada trama do tecido fiado no tear dos tempos, tecido de modo a garantir e cobrir o "íntimo", o privado, e assim velá-lo, com seus segredos, aos olhos do público que é sempre tão ávido do uso comum, do uso de todos... fazendo dos jovens ingênuos ou não, de uns, jovens da vida, de outros, material publicitário vulgar, prostituídos todos sem paga ou promessas. Corpos de uso comum, comércio dos sexos sem esperança.
Instrumentos de vícios.
Nus ao acordarem da paixão, com o tempo ficam de cara como se diz na gíria. E não suportando suas relações vazias de intimidade, e quando este vazio se torna crônico... Enchem ou encherão a cara, de álcool, de drogas, de distrações, de sexo sem intimidade, enfim de qualquer coisa, justamente por não suportarem a vergonha.
Até que o amor os salve na intimidade.


Wallace Requião de Mello e Silva. (1996)
Psicólogo

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