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domingo, 2 de janeiro de 2011

Cachorro de madame.
















Eu estava lá! Agosto de 1992. Miami, Florida, EUA.





Para pensar.


Nós que vivemos no hemisfério sul não sabemos o que é um furacão. É algo aterrorizante, imperativo, sonoro, destruidor, humilhante dos homens na sua arrogância.


Com dois dias de antecedência as rádios começam a dar instruções à população. Deixem seus carros. Evitem engarrafamentos, pois vocês poderão ser pêgos de surpresa. Tomem um ônibus qualquer, todos eles te levarão para algum abrigo. Não levem objetos inúteis, apenas água, gêneros não perecíveis e papel higiênico.
Ao chegar no abrigo me alistei como voluntário da Cruz Vermelha Internacional.
No abrigo nada vimos ou ouvimos. Lá fora o Andrew passava deixando uma esteira de destruição avaliada em 30 biliões ( bilhões) de dólares.
E eu estava lá, bem vivo e animado.

Mas por que motivo estou contando isso. É que ao decidirmos deixar o prédio onde morávamos para procurar um abrigo, uma senhora francesa negou-se a deixá-lo por não concordar em deixar seu cachorrinho sozinho. Colocou sua vida em risco pelo caõzinho. Durante todo o tempo eu me preocupava como estaria ela.

Engraçado, numa circunstância dessas, coletivamente radical é que vemos a fraqueza de um povo. O excesso de conforto, o excesso de comida compulsivamente consumida, o medo da quebra da rotina profissional e o medo do amanhã gerava milhares de desarranjos intestinais, e em poucas horas os vasos sanitários do abrigo estavam entupidos. Quem tem, tem medo; diz o popular. Que desespero em ter que dormir no chão sem cobertas, e viver sem eletricidade e sem ar condicionado. Pessoas sonhavam que estavam abrindo a geladeira e descobriam que esse aparelho doméstico era o centro de suas vidas. Testemunhei tudo.

Ao sair, o quadro era aterrorizante. Faiscas e raios para todos os lados. Canos de água rompidos e encanamentos subterrâneos de gás vazavam com odor insuportável e risco de explosão eminente. Alguns aproveitavam para assaltar os escombros, em busca de dinheiro e armas. Deprimente.

Exercito nas ruas. Barcos imensos no meio das avenidas, aviões de ponta cabeça e automóveis e ónibus lançados ao mar. Não era um espectáculo bonito de se ver. Muito menos testemunhar o sofrimento de quem voltava para casa e não a encontrava.

Mas a senhora do cachorrinho não me saia da cabeça.

Quando pude chegar ao meu bairro, o prédio onde eu morava estava em pé. a senhora estava lá com seu To Tó, sã e salva. Conversando com as pessoas, posteriormente fiquei sabendo que muitas senhoras e senhores haviam se arriscado para ficar com seus cachorros, quase todos franceses.

Depois lendo aqui e ali, descobri que é enorme o número de solitários na França que vivem com seus cachorros.

Que interessante. O país do romantismo, do amor, do erotismo, é na verdade o pais da solidão, dos frustrados afetivamente, dos que desistiram do convívio com outras pessoas, dos que vivem nos seus animais um amor infantil que foge da dor e da perda. Principalmente evita a vontade do outro e suas opiniões. Um país sem crianças. Isso é curioso e revelador. Tirem suas conclusões. Se negam ao coletivo por amor às suas ilusões. Não é interessante?
Ou, eu estou me olhando no espelho?

WallaceReq par o G23.
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