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segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Para a sua reflexão.

No discurso que o General Muricy pronunciou por ocasião de sua posse na chefia do Estado-Maior do Exército, chamou-me a atenção um trecho de ouro. Falando da “guerra revolucionária em que todos hoje nos empenhamos”, disse o orador: “Nessa luta – como um povo só é verdadeiramente dominado quando rompe com seu passado, com sua base cultural e social, com os fundamentos morais herdados dos seus maiores, e com sua base cultural e social, [com os fundamentos morais herdados dos seus maiores], e com sua formação espiritual, e como para os marxistas só é moral o que interessa à realização de seus propósitos – buscam os inimigos da democracia a destruição desses valores. Assistimos no momento à tentativa de destruição dos princípios morais, particularmente no seio da juventude, através de perigosas filosofias que exaltam o erótico e o perverso e procuram quebrar os laços que ligam os jovens ao seu passado e à sua família.
“No aspecto espiritual há forte atuação no sentido de confundir valores, levando a dúvida aos menos esclarecidos, pregando até o contra-senso de uma simbiose comuno-cristã, como solução ideal para os problemas sociais, solução a ser atingida mesmo através da violência. O comunismo é apresentado como solução para o levantamento do homem e para a sua defesa contra o que chamam de alienação”.
Estes conceitos merecem ser meditados por todo bom brasileiro. Dentre eles destacamos especialmente um. Como acabamos de ver, para o General Muricy, a ruptura de um povo com seu passado é obra ardilosa dos comunistas para reduzir esse mesmo povo à servidão. Em outros termos, a preservação da tradição é fator essencial da independência de todo o país.
Talvez a assertiva do distinto oficial choque muitos leitores, que não entendem bem o que é tradição. Vamos, para elucidá-los, citar um trecho lapidar de Pio XII. É o melhor comentário que as palavras do General Muricy comportam.
Começa o Pontífice por mostrar que a tradição não é estagnação: “Muitos espíritos, mesmo sinceros, imaginam e crêem que tal tradição não seja mais do que a lembrança, o pálido vestígio de um passado que não existe mais, que não pode voltar, e que quando muito é relegado com veneração, se se quiser, e com reconhecimento, à conservação de um museu, que poucos amadores ou amigos visitam. Se nisto consistisse e a isto se reduzisse a tradição, e se importasse em recusa ou desprezo do caminho do porvir, seria razoável negar-lhe o respeito e a honra, e seria para se olharem com compaixão os sonhadores do passado, retardatários em face ao presente e ao futuro, e com maior severidade aqueles que, movidos por intenções menos puras e respeitáveis, mais não são do que desertores dos deveres da hora que se mostra tão lutuosa”.
Mostra depois que, se o progresso é marcha para a frente, a tradição constitui um valor inapreciável nesta marcha; ela é o rumo: “Mas a tradição é coisa muito diversa de um simples apego a um passado já desaparecido, é justamente o contrário de uma reação que desconfie de todo são progresso. O próprio vocábulo, etimologicamente é sinônimo de caminho e marcha para a frente – sinonímia e não identidade. Com efeito, enquanto o progresso indica somente o fato de caminhar para a frente, passo após passo, procurando com o olhar um incerto porvir, a tradição indica também um caminho para a frente, mas um caminho contínuo, que se desenvolve ao mesmo tempo tranqüilo e vivaz, de acordo com as leis da vida, escapando à angustiosa alternativa: “Si jeunesse savait, si vieilleisse pouvait!”, semelhante aquele Senhor de Turenne, do qual foi dito: “teve em sua mocidade toda a prudência de uma idade avançada, e em uma idade avançada todo o vigor da juventude” (Fléchier, Oração Fúnebre, 1676)”.
Em seguida, ele acentua a profunda harmonia entre o verdadeiro progresso e a verdadeira tradição:“Por força da tradição, a juventude, iluminada e guiada pela experiência dos anciãos, avança com passo mais seguro, e a velhice transmite e consigna confiante o arado a mãos mais vigorosas, que continuam o sulco já iniciado. Como indica seu nome, a tradição é um dom que passa de geração em geração; é a tocha que o corredor a cada revezamento põe na mão e confia a outro corredor, sem que a corrida pare ou arrefeça de velocidade”.
E conclui, triunfalmente, que a tradição é indispensável ao progresso: “Tradição e progresso reciprocamente se completam com tanta harmonia que, assim como a tradição sem o progresso se contrariaria a si mesma, assim também o progresso sem a tradição seria um empreendimento temerário, um salto no escuro” (Discurso do Santo Padre Pio XII à Nobreza e ao Patriciado Romano, em 1944, publicado pelo “L’Osservatore Romano” em 20 de janeiro de 1944).
Um país que progrida velozmente e sem tradição é como um homem que anda rapidamente sem caminho e sem rumo! Quanto mais rápida a marcha, mais louca, mais extenuante. Por fim, o homem se depaupera, se extenua e cambaleia: então está no ponto de ser subjugado por qualquer salteador que o encontre.
No caso, o salteador é o comunismo… com a máscara de progressismo.






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sábado, 28 de novembro de 2015

Recordando texto de papai.

A Ecologia Cristã. (Texto de Wallace Requião de Mello e Silva publicado pelo “O Estado do Paraná” em 10 de Março de 1991).

A ecologia cristã difere muito da ecologia neopagã. A ecologia neopagã supõe uma onipotência da matéria e da natureza, diferentemente da ecologia cristã que pressupõe a existência de Deus. Deus que é o criador de todas as coisas vivas e de toda a matéria, não se confunde com sua criação, com as coisas criadas, e é capaz de criar tudo novamente e tudo retirar do nada.

Por outro lado, os ecologistas neopagãos, acreditam que o homem é capaz de destruir toda a natureza, ou conservá-la ao seu bel prazer, argumento falso e ingênuo, que despreza a realidade cósmica onde estamos inseridos. A natureza cósmica é imensa e o homem ínfimo. Quando nos detemos a contemplar as relações dos seres vivos com seu meio ambiente, percebemos de imediato a fragilidade do argumento neopagão. Por exemplo: estiveram ao sabor da vontade humana as glaciações? Estão ao sabor da vontade humana os desvios da eclíptica? Os movimentos dos planetas, as manchas solares e suas conseqüências, os terremotos, maremotos e os vulcões que mudaram muitas vezes a face do planeta... e, ou, a assustadora extinção das espécies que dizem ter existido antes do surgimento dos homens? É claro que não.

A ecologia cristã admite um meio ambiente exterior e imediato ao homem, onde predomina e impera a onipotência de Deus, e um meio interior, onde impera a inteligência, à vontade e o livre arbítrio do homem.

 A ecologia cristã admite que Deus tenha vontade sobre o homem e sobre todas as coisas criadas, mas que ao mesmo tempo respeita a liberdade que ele mesmo deu ao homem. É essa liberdade de escolha que difere os homens dos animais.

No entanto o ecologista cristão sabe que a vontade de Deus sobre a criação não é algo velado e subjetivo, mas sim é expressão clara e objetiva. Chamamos a essa minuciosa expressão da vontade divina de Ecologia Revelada, ou melhor, ecologia deduzida da revelação divina. Assim o ecologista cristão ao admitir a ação do homem sobre o meio ambiente exterior reconhece que essa ação é sempre precedida de uma ação interior, uma ação ou omissão da alma.

O ecologista cristão ao isolar o homem dos outros seres vivos pela liberdade de escolha, sua máxima característica, admite a moralidade de todo o ato humano, ou seja, se o ato não é moral, não é humano, e os teólogos o diferenciam dos atos do homem, atos vitais do homem enquanto ser vivo. Posto isso a ecologia cristã é essencialmente moral, espiritual, e visa restabelecer a ordem e harmonia do interior humano. Este fenômeno de harmonia interior é que se refletirá no meio ambiente exterior (imediato e ao alcance do homem). Tudo submetido aos desígnios de Deus.

Dessa forma e diante dessa linha moral é que se percebe, por exemplo, que de nada adiantará a proteção às baleias se aqueles que as defendem são favoráveis ao aborto. Acho que é patente a contradição.

Podemos afirmar que não haverá movimento ecológico verdadeiro e eficiente se o militante não acreditar, e perceber que existe uma vontade perfeita sobre todas as coisas e sobre todas as criaturas, e no caso humano essa vontade perfeita nos fez e exige que sejamos morais. Pois vista unicamente seguindo uma ótica materialista a matéria em constante transformação destruirá a si mesma para galgar novas formas, portanto, não haveria o que preservar e o homem por sua vez, viverá apenas para ser instrumento de destruição da matéria sobre si mesma. Chamam os neopagãos (materialistas) a este processo de evolução e acidentalidade da matéria... Tolice.

Os ecologistas cristãos sabem e pregam que a vontade perfeita, divina, necessária para a formulação do conceito de harmonia é revelada e confirmada em Jesus Cristo de uma maneira clara, normatizando e preservando a harmonia interior do homem e deste modo regulando todas as suas relações com os outros homens e deles para com todo o universo criado em Deus. (quando digo em Deus, não digo dentro de Deus, que é panteísmo, digo em Deus, segundo as normas de Deus)

O conceito de crime ecológico nada mais é que a ação criminosa (imoral) do homem, grupo de homens ou de toda a sociedade sobre o meio que lhe circunda, pois põe em risco a vida, e preservar a vida é ato moral. Sendo ação humana muitas vezes consciente e livre realiza uma ação interior, uma ação moral. Portanto a ação que resulta em crime ecológico é uma ação moral, pois se não fosse moral não haveria crime. (um animal não comete crime ambiental). Assim sendo, o conceito de crime ecológico é inferior e está contido no conceito de crime, pois o segundo antecede o primeiro e é a sua causa.

 Muito diferente é o conceito de acidente ecológico que é sempre um acontecimento fortuito, infeliz, lamentável. Assim entendido, ambos os conceitos citados acima estão contidos no conceito cristão de pecado. O pecado, sob a ótica do Direito, e da Teologia,  enquanto ofensa a vontade de Deus (Sagradas Escrituras e Mandamentos) é, num só tempo, lesão à harmonia e lesão aos direitos de outrem, e por conseqüência causando perturbação grave na ordem do ambiente moral, social e físico no entorno do homem, pode ser entendido como crime ecológico, tanto pela ótica da revelação como pela ótica da lei natural.

 Concluímos, portanto, que não haverá verdadeiro espírito ecológico enquanto houver perseverança no pecado, seja essa perseverança individual ou coletiva. Foi pelo pecado que perdemos o paraíso.

Se compreendermos perfeitamente essa relação, poderemos então concluir a titulo de exemplo, que não há ecologia onde houver homicídio (pecado contra á vida), onde houver homossexualismo (pecado contra a natureza), onde houver aborto (pecado contra a natureza e a espécie), onde houver anticoncepção (pecado de soberba que supõe ao homem a capacidade de previsão do futuro), onde houver divórcio (pecado contra a base das relações sociais, a família, contra os filhos e sua educação, portanto ofensa a estabilidade das relações sociais e da função da paternidade), onde impera a ideologia materialista (que nega a moral humana e a coloca numa ética transitória) onde houver usura e o desrespeito a propriedade. Não haverá ecologia onde não houver amor e temor de Deus, onde houver licenciosidade das relações sociais e, portanto sexuais, onde houver intemperança, ganância orgulho. São os pecados econômicos.

Entendemos facilmente que a ecologia cristã se fundamenta no amor e temor de Deus e no ódio ao pecado. Ecologia Cristã se fundamenta nos mandamentos de Jesus Cristo Nosso Senhor e rende-se diante da onipotência divina.

 Concluindo: enquanto os neopagãos pregam o serviço do homem à natureza, os ecologistas cristãos pregam e reconhecem a subordinação da natureza criada ao homem em Deus. A NATUREZA DESORDENADA PELO PECADO ORIGINAL PRECISA SER REORDENADA PELA LIVRE ADESÃO DO HOMEM AOS MANDAMENTOS DE DEUS.

Wallace Requião de Mello e Silva
Grupo 23 de Outubro.

Kassia Zig


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Não me move.

«Não me move» (Santa Teresa de Ávila)

Não me move, Senhor para Te amar
O Céu que me prometestes
Nem me move o inferno tão temido
Para deixar por isso de Te ofender.

Tu me moves, Senhor,
Move-me ver-Te
Pregado em uma Cruz e escarnecido
Move-me ver teu Corpo tão ferido,
Movem-me tuas afrontas e tua morte.

Move-me enfim o teu amor,
E de tal maneira,
Que ainda que não houvesse Céu eu Te amaria,
E ainda que não houvesse inferno Te temeria.

Nada tens que me dar para que eu Te queira,
Pois mesmo que eu não esperasse o que espero,
O mesmo que Te quero
Eu te quereria.

(Santa Teresa de Ávila)


«Te Deum»

Nós vos louvamos, ó Deus,
nós vos bendizemos, Senhor.
Toda a terra vos adora,
Pai eterno e omnipotente.

Os Anjos, os Céus e todas as Potestades,
os Querubins e os Serafins vos aclamam sem cessar:
Santo, Santo, Santo, Senhor Deus do Universo,
o céu e a terra proclamam a vossa glória.

O coro glorioso dos Apóstolos,
a falange venerável dos Profetas,
o exército resplandecente dos Mártires
cantam os vossos louvores.

A santa Igreja anuncia por toda a terra
a glória do vosso nome:
Deus de infinita majestade,
Pai, Filho e Espírito Santo.

Senhor Jesus Cristo, Rei da Glória,
Filho do Eterno Pai,
para salvar o homem, tomastes a condição humana
no seio da Virgem Maria.

Vós despedaçastes as cadeias da morte
e abristes as portas do Céu.
Vós estais sentado à direita de Deus, na glória do Pai,
e de novo haveis de vir para julgar os vivos e os mortos.

Socorrei os vossos servos, Senhor,
que remistes com o vosso Sangue precioso;
e recebei-os na luz da glória,
na assembleia dos vossos Santos.

Salvai o vosso povo, Senhor,
e abençoai a vossa herança;
sede o seu pastor e guia através dos tempos
e conduzi-os às fontes da vida eterna.

Nós vos bendiremos todos os dias da nossa vida
e louvaremos para sempre o vosso nome.
Dignai-vos, Senhor, neste dia, livrar-nos do pecado.
Tende piedade de nós, Senhor, tende piedade de nós.

Desça sobre nós a vossa misericórdia,
porque em vós esperamos.
Em vós espero, meu Deus,
não serei confundido eternamente.




Carta aos amigos da Cruz

Carta aos Amigos da Cruz
São Luís Maria de Montfort










Tú que descanso buscas com cuidado,
Neste mar do mundo tempestuoso
Não esperes de achar nenhum repouso,
Senão em Cristo Jesus Crucificado.
Camões







Nihil Obstat
Rio de Janeiro, 30 de janeiro de 1954
Dom Estevão Bittencourt, O.S.B.
Censor







Pode imprimir-se
Rio, 9 de fevereiro de 1954
Mons. Caruso
pro Vigário Geral















Prefácio

É um grande apóstolo da Cruz que expande sua alma nesta carta. A exemplo de S. Paulo, Montfort “só quer saber... Jesus Cristo, e Jesus Cristo crucificado (I Cor., II, 2); Cristo pregado na Cruz, que é escândalo para os Judeus, para o mundo loucura, mas, para os eleitos... é Sabedoria de Deus” (I Cor., I, 23-24)
Em seu livro intitulado “O Amor da Sabedoria eterna”, belas páginas já cantavam o mistério de nossa salvação, principalmente, entre outras, aquelas em que é celebrada a união indissolúvel de Jesus com a Cruz(n° 168 e segs.). Num lirismo não igualado, demonstra aé que não se pode amar a um sem amar a outra. E é o programa da vida cristã, proposto pelo Divino Mestre a todos os seus discípulos, que São Luís Maria comenta sem artifícios, para uso dos seus queridos “Amigos da Cruz”.
Ao pregar em Nantes, em 1708, uma missão na paróquia de São Similiano, o Padre de Montfort havia agrupado, numa Confraria dos Amigos da Cruz, os seus ouvintes mais fervorosos. Ao passar por essa cidade, em várias ocasiões, os gavia animado a perseverar em seu fervor primitivo. Bem cedo foi-lhe preciso reduzir as conversas particulares o seu ministério junto a eles. Assim aconteceu notadamente durante o decorrer do verão de 1714, quando o santo missionário empreendeu sua viagem à Normandia. Não pôde com efeito, usar publicamente da palavra; a interdição que pesava sobre ele, desde o incidente do Calvário de Pont-Château, não havendo sido ainda levantada.
Rennes era sua segunda etapa depois de Nantes. Lá também os Jansenistas vigiavam e suas intrigas reduziram ao silêncio o seu temível adversário. A seu pedido, os Padres Jesuítas abriram ousadamente a porta do colégio onde outrora havíam formado sua jovem alma. O apóstolo aí se refugiou em retiro; durante oito dias contemplou o mistério do Calvário. Incessantemente face a face e coração a coração com o Homem das Dores e com sua Mãe Santíssima, hauriu novas luzes e as mais ardentes chamas.
É o fruto de sua contemplação que, “no seu último dia de retiro”, quis fazer saborear aos seus fervorosos discípulos, nas páginas de uma carta em que o ardor de apóstolo consumido de desejo de atrair as almas para o caminho da cruz, se tempera sabiamente de prudência nos conselhos práticos que lhes apresenta.
Quererá isto dizer que se deva ver na “Carta Circular aos Amigos da Cruz” uma improvisação? Decerto que Não; é ela que o santo viveu e pregou durante toda a sua vida. São testemunhas disto os seus dois cânticos sobre “A força da paciência” (39 estrofes e 8 versos) e “O triunfo da Cruz” (31 estrofes do mesmo comprimento), que ele vinha rimando, segundo se julga, desde o Seminário, e onde encontramos quase todos os elementos da Carta. É testemunha disto o lugar que dá, no alto de seus 62 “Oráculos”, ao programa do Divino Mestre: “Se alguém quiser vir após mim...”, e que aqui se encontra longamente desenvolvido. É testemunha, disto, principalmente, o belo capítulo intitulado “O triunfo da eterna Sabedoria na Cruz e pela Cruz”, capítulo XIV de “O Amor da Eterna Sabedoria”, obra escrita, sem dúvida, em sua juventude sacerdotal. Testemunham-no ainda  os seus três planos de sermões  sobre “O  Amor da Cruz”, e outro sobre “A Exaltação da Santa Cruz”, seguido de “XV Práticas para se conduzir nas cruzes com perfeição”. Testemunha-o, por fim, a Cruz coberta de máximas que fez erguer no Hospital de Poitiers, “no meio da sala em que reuniu as primeiras Filhas da Sabedoria”.
Ao encontrar, na Carta-Circular, as riquezas da Escritura, dos Padres da Igreja e dos teólogos, onde Montfort hauriu o melhor de sua doutrina, não se pode deixar de reconhecer  a parte de ifluência exercida sobre ele pr M. Boudon, ilustre arcipreste de Evreux. “Les sainctes voyes de la Croix”, por este autor, eram, segundo o testemunho de M. Blain, condissípulo de Luís Maria, seu livro preferido no Seminário de São Sulpício. Encontramos na “Carta ao Amigoa da Cruz” várias passagens extraídas do livro de M. Boudon. Já não havia “Le sainct esclavage de la Mère de Dieu”,  pelo mesmo autor, feito as delícias do Seminarista que deveria escrever um dia o “Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem?”

Gostamos - e a justo título - de ver em Montfort o grande apóstolo de Nossa Senhora. Sua perfeita devoção a Maria, porém, é apenas um meio, -o meio por excelência,- de conduzir a almas a Jesus. “Se estabelecemos a sólida devoção à Santíssima Virgem é apenas para mais perfeitamente estabelecer a de Jesus Cristo, é apenas para dar um meio fácil e seguro de encontrar Jesus Crito”(V.D., n° 62).
Procuremos lembrar-nos disto ao ler e meditar a “Carta sobre a Escravidão à Santíssima Virgem”e talvez também o seu luminoso tratado da “Verdadeira Devoção”. A presente “Carta” lhes está ligada, ousmos dizer, como desenvolvimento, como complemento do pensamento do santo autor, “no desígnio que Ele tem de formar um verdadeiro devoto de Maria e um Verdadeiro discípulo de Jesus Cristo”(V.D., n° III).

Mal acabava de ser escrita a “Carta Circular”, foi impressa, na própria Rennes, graças aos bons ofícios de M. d’Orville. Espalhou-se ela assim, largamente, entre os amigos da Cruz e as almas devotas. O manuscrito, entretanto, foi piedosamente conservado. Em 1770, o Revmo. Pe. Besnard, superior geral da Companhia de Maria e das filhas da Sabedoria, atesta que esse manuscrito se acha em poder dos Missionários de Saint-Laurent-sur-Sèvre. Desde então, entretanto, ignora-se o seu paradeiro. Terá ele desaparecido durante a guerra da Vendéa?
Dada a falta do manuscrito, cuja perda devemos lamentar, dada a falta mesmo de antigos exemplares impressos, utilizamos para esta edição o texto de 1830, publicado pelo Revmo. Pe. Delin, escritor geralmente fidelíssimo em suas transcrições e que fez dessa fidelidade lei.
Permitimo-nos apenas adotar pontuação e parágrafos mais conformes ao gosto do leitor moderno. Pelo mesmo motivo foram postos em evidência os sumários sugeridos pelo texto, que não trazia nem sub-títulos, nem divisões. Foram acrescentados em nota alguns esclarecimentos úteis, bem como as principais referências das passagens da Sagrada Escritura de que a “Carta” está repleta. Como para as outras obras do santo, números entre colchetes, independentes da paginação, facilitarão as voltas ao texto.
Foi tomada para modelo, na apresentação desta “Carta”, a “Edição-Tipo” (1926) da “Carta sobre a Escravidão à Santíssima Virgem”, ou “O Segredo de Maria” (I). Assim as duas cartas irão juntas à conquista das almas, para maior glória de Jesus e de sua Mãe.
A.P.D.

(1) “O Segredo de Maria” e o “Método de Rezar o Rosário, também de Montfort.









Aos Amigos da Cruz

Introdução

Queridos Amigos da Cruz,

[1] Já que a divina Cruz me esconde e me interdiz a palavra, não me é possível - e nem mesmo o desejo - falar-vos para vos externar os sentimentos do meu coração sobre a excelência e as práticas divinas de vossa União na Cruz adorável de Jesus Cristo(1).
Hoje, entretanto, último dia de meu retiro, saio, por assim dizer, da atração do meu interior, para traçar neste papel alguns leves dardos da Cruz, para com eles atravessar vossos corações. Prouvesse a Deus fosse necessário, para acerá-los, o sangue de minhas veias em lugar da tinta de minha pena! Mas, ai de mim! mesmo se ele fosse necessário, é por demais criminoso. Que o Espírito do Deus vivo seja, pois, a vida, a força e o teor desta carta; que sua unção seja a tinta de meu tinteiro; que a divina Cruz seja minha pena e o vosso coração meu papel!(2)


Primeira Parte

Excelência da União dos Amigos da Cruz

Apelo à união dos espíritos e dos corações.

[2] Estais reunidos, Amigos da Cruz, como outros tantos soldados crucificados(3), para combater o mundo; não fugindo, como os religiosos e religiosas, pelo medo de serdes vencidos; mas como valorosos e bravos guerreiros no campo de batalha, sem largar o pé e sem voltar as costas. Coragem! Combatei valentemente! Uni-vos fortemente pela união dos espíritos e dos corações, infinitamente mais forte e mais temível ao mundo e ao inferno do que o são, para os inimigos do Estado, as forças exteriores de um reino bem unido. Os demônios se unem para perder-vos; uní-vos para derrotá-los. Os avarentos se unem para traficar e ganhar ouro e prata; uni vossos trabalhos para conquistar os tesouros da eternidade, encerrados na Cruz. Os libertinos se unem para divertir-se; uni-vos pra sofrer.

1° - Grandeza do Nome de Amigos da Cruz

A) Este nome é grande e glorioso

[3] Chamai-vos Amigos da Cruz. Como é grande esse nome! Confesso-vos que ele me encanta e deslumbra. É mais brilhante que o sol, mais elevado que os céus, mais glorioso e mais pomposo que os títulos mais magníficos dos reis e dos imperadores. É o grande nome de Jesus Cristo, a um tempo verdadeiro Deus e verdadeiro homem; é o nome inequívoco de um cristão.

B) Mas quantas obrigações encerra!

[4] Entretanto, se seu brilho me encata, seu peso não me espanta menos. Quantas obrigações indispensáveis e difíceis contidas neste nome e expressas por estras palavras do Espírito Santo; “Genus electum, regale sacerdotium, gens sancta, populus acquisitionis (4)”!

Um amigo da Cruz é um homem escolhido por  Deus, entre dez mil que vivem segundo os sentimentos e a razão, para ser unicamente um homem todo divino e elevado acima da razão, e todo em oposição aos sentimentos, por uma vida e uma luz de pura fé e por um amor ardente pela Cruz.
Um Amigo da Cruz é um rei todo poderoso e um herói triunfante do demônio, do mundo e da carne em suas três concupiscências. Pelo amor às humilhações, esmaga o orgulho de Satanás; pelo amor à pobreza, triunfa da avareza do mundo; pelo amor à dor, amortece a sensualidade da carne.
Um Amigo da Cruz é um homem santo e separado de todo o visível, cujo coração está acima de tudo quanto é caduco e perecível, e cuja conversa está no Céu (5); que passa pela terra como estrangeiro e peregrino; e que, sem lhe dar o coração, a contempla com o olho esquerdo com indiferença, calculando-a com desprezo  aos pés (6).

Um Amigo da Cruz é uma ilustre conquista de Jesus Cristo crucificado no Calvário, em união com sua Santa Mãe; é um Benoni ou um Benjamin, filho da dor e da dextra (7), gerando em seu dolorido coração, vindo ao mundo por seu lado direito atravessado e coberto da púrpura de seu sangue. Dada a sua extração sangrenta, só respira cruz, sangue e morte ao mundo, à carne e ao pecado, para estar totalmente oculto, aqui na terra, com Jesus Cristo em Deus (8).
Enfim, um perfeito Amigo da Cruz é um verdadeiro porta-Cristo, ou antes, um Jesus Cristo, de maneira que possa, em verdade, dizer: “Vivo, ja no ego, vivit vero in me Christus: vivo, mas não eu, é Jesus Cristo que vive em mim”(9)

Exame de consciência sobre essas obrigações.

[5] Sois, por vossas ações, meus queridos Amigos da Cruz, aquilo que vosso grande nome significa? Ou pelo menos, tendes verdadeiro desejo e vontade verdadeira de assim vos tornades, com a graça de Deus, à sombra da Cruz do Cálvário e de Nossa Senhora da Piedade? Entrastes no verdadeiro caminho da vida (10), que é o caminho estreito e espinhoso do Calvário? Não estareis, sem o pensar, no caminho da perdição? Sabeis bem que há um caminho que parece ao homem reto e seguro, e que conduz à morte?
[6] Distinguís bem a voz de Deus e de sua graça da voz do mundo e da natureza? Ouvís bem a voz de Deus, nosso Pai, que, depois de ter dado sua tríplece maldição a todos os que seguem as concupiscências do mundo: vae, vae, vae habitantibus in terra (11), grita-vos amorosamente, estendendo-vos os braços: “Separamini, popule meus”(12). Separai-vos, meu povo escolhido, queridos Amigos da Cruz de meu Filho; separai-vos dos mundanos, malditos por minha Majestade, excomungados por meu Filho (13) e condenados pelo meu Espírito Santo (14). Tomai cuidado para não vos sentardes em sua cadeira toda empestada, não sigais os seus conselhos, nem mesmo pareis em seu caminho (15). Fugi do meio da grande e infame Babilônia (16); não escuteis outra voz e não sigais outras pegadas que não as de meu Filho bem amado, que vos dei para que fosse vosso caminho, vossa verdade, vossa vida (17) e vosso modelo: “Ipsum audite”(18).
Ouvís o amável Jesus, que, carregando sua Cruz, vos grita: “Venite post me: vinde após mim; o que me segue não anda em trevas (19); confidite, ego vici mundum, tende confiança, eu venci o mundo (20)”?


2° - Os Dois Partidos

A) O partido de Jesus e do mundo

[7] Eis aqui, meus caros Confrades, eis aqui dois partidos (21) que se defrotam todos os dias; o de Jesus Cristo e o do mundo.
O de nosso amável Salvador está à direita, em aclive, num caminho estreito e que assim cada vez se tornou devido à corrupção do mundo.
Caminha à frente o bom Mestre, os pés descalços, a cabeça coroada de espinhos, o corpo todo ensanguentado, e carregando uma pesada Cruz. Apenas algumas pessoas, e das mais corajosas, o seguem, porque sua voz tão delicada não se ouve no meio do tumulto do mundo; ou então, não se tem coragem para seguí-lo em sua pobreza, suas dores, suas humilhações e suas outras cruzes, que necessariamente é preciso carregar, a seu serviço, todos os dias da vida.
[8] À esquerda está o partido do mundo, ou do demônio, que é mais o numeroso, o mais signífico e o mais brilhante, pelo menos na aparência. Todos os indivíduos mais brilhantes correm para ele; apressam-se, apesar de serem os caminhos largos, mais largos, do que nunca em virtude das multidões que por eles passam como torrentes, e de estarem juncados de flores, marginados de prazeres e divertimentos, cobertos de ouro e de prata (22).

B) Espírito totalmente oposto dos dois partidos.

[9] À direita, o rebanhinho que segue a Jesus Cristo só fala em lágrimas, em penitências, em orações e em desprezo do mundo; ouvem-se continuamente estas palavras (23), entrecortadas de soluços: “Soframos, choremos, jejuemos, oremos, ocultemo-nos, humilhemo-nos, empobreçamo-nos, mortifiquemo-nos; porque o que não tem o espírito de Jesus Cristo, que é um espírito de cruz, não pertence a Ele; os que são de Jesus Cristo mortificaram a carne com as suas concupiscências; é preciso ser conforme à imagem de Jesus Cristo (24) ou condenar-se. Coragem! exclamam eles. Coragem! Se Deus está por nós, quem estará contra nós? Aquele que está em nós é mais forte que o que está no mundo. O servo não é maior que o senhor. Um momento de leve tribulação redunda em peso eterno de glória. Há menos eleitos do que se pensa. Só os corajosos e os violentos arrebatam o céu de viva força; ninguém será lá coroado se não houver combatido legitimamente, segundo o Evangelho, e não segundo a moda. Combatamos, pois, vigorosamente, corramos depressa para atingir a meta, a fim de ganharmos a coroa!” Eis uma parte das palavras divinas com que os  Amigos da Cruz mutuamente se animam.
[10] Os mundanos, ao contrário, gritam todos os dias, para animar-se a perseverar em sua malícia sem escrúpulos (25) “Vida, vida! Paz, paz! Alegria, alegria! Comamos, bebamos, cantemos, dancemos, brinquemos! Deus é bom, Deus não nos fez para que nos danássemos; Deus não proíbe que nos divirtamos; Não nos danaremos por isso. Nada de escrúpulos! Non moriemini. etc...”

C) Amoroso apelo de Jesus

[11] Lembrai-vos, meus caros Confrades, que nosso bom Jesus nos olha neste instante e diz a cada um de vós em particular: “Eis que quase todos me abandonaram no caminho real da Cruz. Os idólatras cegos zombam de minha cruz como de uma loucura, os Judeus obstinados se escandalizam (26) com ela, como se fosse objeto de horror, os herejes quebraram-na e derrubaram-na como coisa digna de desprezo. Mas, e isto só posso dizer com lágrimas nos olhos e com o coração transpassado de dor, os filhos que criei em meu seio e que instruí em minha escola, os meus membros, que animei com meu espírito, me abandonaram e desprezaram, tornando-se inimigos de minha cruz! (27) - Numquid et vos vultis abire?(28) Quereis, vós também, abandonar-me, fugindo da minha Cruz, como os mundanos, que nisto são outros tantos anticristos: antichristi multi? (29) Quereis enfim, conformar-vos ao século presente (30), desprezar a pobreza de minha Cruz, para correr após as riquezas? Evitar a dor de minha Cruz para procurar aos prazeres? Odiar as humilhações de minha Cruz, para ambicionar as honras? Tenho, na aparência, muitos amigos que me fazem protestos de amor, e que, no fundo, me odeiam, pois não amam minha Cruz; muitos amigos de minha mesa e pouquíssimos amigos de minha Cruz (31)

[12] A este apelo amoroso de Jesus, elevamos acima de nós mesmos; não nos deixemos seduzir pelos nossos sentidos, como Eva; não olhemos senão o autor e consumador de nossa fé, Jesus crucificado (32), fujamos da corrupção da concupiscência do mundo (33) corrompido; amemos Jesus Cristo da melhor maneira, isto é, através de toda sorte de cruzes. Meditemos bem estas admiráveis palavras de nosso amável Mestre, que encerram toda a perfeição da vida cristã: “Si quis vult venire post me, abneget semetpsum, et tollat crucem suam, et sequatur me! (34)


Segunda Parte

Práticas da Perfeição Divina Cristã

O programa do Divino Mestre
[13] Toda a perfeição cristã, com efeito, consiste:
1°: em querer tornar-se santo: “Se alguém quiser vir após mim”;
2°: em abster-se: “renuncie a si mesmo”;
3°: em sofrer: “carregar sua cruz”;
4°: em agir: “siga-me”

1° - Querer tornar-se Santo:

“Se Alguém Quiser Vir Após Mim”

A) “Se alguém...”

“Si quis”, se alguém, alguém, e não alguns, para marcar o pequeno número dos eleitos que se querem tornar conformes a Jesus Cristo crucificado, carregando a cruz. É tão pequeno esse número, tão pequeno, que se o soubéssemos ficaríamos pasmados de dor.
É tão pequeno que não há apenas um em cada dez mil, como foi revelado a vários santos, - entre outros a São Simeão Estilita, segundo narra o santo abade Nilo, bem como Santo Efrém, São Basílio e alguns outros. (35) É tão pequeno que, se Deus quisesse reuní-los, gritar-lhes-ia, como se outrora pela baca do profeta: Congregamini unus et unus, reuni-vos de um a um, um desta provícia, outro deste reino...(36).

B) Se alguém quiser...

[15] Si quis vult, se alguém tiver vontade verdadeira, firme e determinada, não pela natureza, o costume, o amor próprio, o interesse ou o respeito humano, mas, por uma graça toda virtuosa do Espírito Santo, que não se dá a todos: non omnibus datum est nosse myterium(37). O conhecimento do mistério da Cruz, na prática, só é dado a poucas pessoas. Para um homem subir ao Calvário e aí se deixar pregar na Cruz com Jesus, em sua própria pátria, é preciso que seja um bravo, um herói, um determinado elevado em Deus, que despreze o mundo e o inferno, seu corpo e sua vontade própria; um determinado a deixar tudo, a tudo empreender e a tudo sofrer por Jesus Cristo.
Sabei, queridos Amigos da Cruz, que aqueles dentre vós que não têm esta determinação, andam com um pé só, voam com uma só asa e não são dignos de estar no meio de vós, porque não são dígnos de ser chamados Amigos da Cruz, que devemos amar, com Jesus Cristo, corde magno et animo volenti (38). Basta uma meia vontade, neste caso, para por, como uma ovelha preta, o rebanho a perder. Se em vosso aprisco já existe uma delas, entrada pela porta má do mundo, em nome de Jesus Cristo crucificado expulsai-a como a um lobo que estivesse entre os cordeiros!

C) ... Vir após mim

[16] Si quis vult post me venire, se alguém quiser vir após mim, - que tanto me humilhei e aniquilei, que me tornei mais semelhante a um verme que a um homem, ego sum vermis et non homo(39); após mim, que só vim ao mundo para abraçar a Cruz, - ecce venio (40); para colocá-la no centro de meu coração -im medio cordis (41); para amá-la desde a minha juventude, hanc amavi a juventute mea; para suspirar por ela durante a minha vida, quomodo coarctor? (42); para carregá-la com alegria, preferindo-a a todas as alegrias do céu e da terra, proposito sibi gaudio, sustinuit crucem (43); e que, enfim, só me contentei quando morri em seu divino abraço. (44)

2° - Abster-se

“Renuncie a Si Mesmo!”

Longe dos Amigos da Cruz os orgulhosos e os sensuais!

[17] Se pois, alguém quiser vir após mim assim aniquilado e crucificado, que só se glorifique, como eu, na pobreza, nas humilhações e nas dores de minha Cruz! abneget semetipsum, renuncie a si mesmo!
Longe da Companhia dos Amigos da Cruz os sofredores orgulhosos, os sábios do século, os grandes gênios e os espíritos fortes, que são teimosos e convencidos de suas luzes e talentos! Longe daqui os grandes tagarelas, que fazem muito ruido e colhem apenas o fruto da vaidade! Longe daqui os devotos orgulhosos e que levam para toda parte o “quanto a mim”do orgulhoso Lúcifer, “non sum sicut ceteri” (45), que não podem suportar que os censurem sem desculpar-se, que os ataquem sem defender-se, que os rebaixem sem exaltar-se!
Tende bem cuidado para não admitir em vossa companhia os delicados e sensuais, que temem a menor picadela, que se queixam de mínima dor, que nunca provaram a crina, o cilício, a disciplina e, entre as suas devoções em moda, misturam a mais disfarçada e refinada delicadeza e falta de mortificação.

3° - Sofrer
“Carregue a Sua Cruz!”

A) Sua cruz...

[18] Tollat crucem suam, que carregue a sua cruz; suam, a dele! Que esse homem, que essa mulher raros, de ultimis finibus pretium ejus (46) cujo preço toda a terra, de uma extremidade a outra, não poderia pagar, tome com alegria, abrace com ardor e leve aos ombros, com coragem, a sua cruz e não a de outro; a cruz que, com a minha sabedoria, fiz para ele em número, peso e medida; sua cruz, a que, com minhas próprias mãos, pus, com grande exatidão, suas quatro dimensões, a saber: sua espessura, seu comprimento, sua largura e sua profundidade (47), - sua cruz que lhe talhei de uma parte da que carreguei no Calvário, por um efeito da bondade infinita que tenho para com ele; - sua cruz, que é o maior presente que possa fazer aos meus eleitos na terra; - sua cruz, composta, em sua espessura, das perdas de bens, das humilhações, dos desprezos, das dores, das enfermidades e das penas espirituais que devem, por minha providência, chegar-lhe cada dia, até a morte, - sua cruz, composta, em seu comprimento, de um certo número de meses ou de dias em que ele deverá ser aniquilado pela calúnia, estar estendido num leito, ser forçado a mendigar, e tornar-se presa das tentações, da aridez, do abandono e de outras penas do espírito; - sua cruz, composta, em sua largura, das circunstâncias mais duras e mais amargas, sejam elas causadas pelos amigos, os criados ou os parentes; - sua cruz, enfim, composta, em sua profundidade, pelas mais ocultas penas com que o afligirei, sem que possa encontrar consolação nas criaturas que, por minha ordem, voltar-lhe-ão mesmo as costas e juntar-se-ão a mim para fazê-lo sofrer.

B) “Leve-a!”

[19] “Tollat”, leve-a! E não a arraste, nem sacuda, nem reduza e, ainda menos, a esconda! isto é: leve-a  bem alto na mão, sem impaciência nem pesar, sem queixa nem murmuração voluntária, sem partilha e sem alívio natural, sem envergonhar-se e sem repeito humano.
“Tollat”, que a coloque sobre a fronte, dizendo com São Paulo: “Mihi absit gloriari nisi in cruce Domini nostri Jesu Christi! Que eu me abstenha de gloriar-me de outra coisa que não a Cruz de meu Senhor Jesus Cristo! (48)
Leve-a aos ombros a exemplo de Jesus Cristo, a fim de que essa cruz se torne para ele a arma de suas conquistas e o cetro de seu império: (imperium) principatus (ejus) super humerum ejus (49).
Enfim, coloque-a, pelo amor, em seu coração, para torná-la numa sarça ardente, que, sem consumir-se queime, noite e dia, de puro amor de Deus.

C) ...A Cruz!

[20] Crucem, a cruz (50); que ele a leve, pois nada existe que seja tão necessário, tão útil, tão doce ou tão glorioso quanto sofrer alguma coisa por Jesus Cristo.

a) Nada tão necessário para os pecadores!

[21] Com efeito, queridos Amigos da Cruz, sois todos pecadores; não há um só dentre vós que não mereça o inferno, e eu mais que ninguém. É preciso que nossos pecados sejam castigados neste mundo ou no outro; se o forem neste, não o serão no outro.
Se Deus os castigar neste munto de concerto conosco, sua punição será amorosa: quem há de castigar será a misericórdia, que reina neste mundo, e não a justiça rigorosa; o castigo será leve e passageiro, acompanhado de atenuantes e de méritos, seguido de recompensas no tempo e na eternidade.
[22] Mas se o castigo necessário dos pecados que cometemos for no tempo reservado para o outro mundo, a punição caberá à justiça vingadora de Deus, que leva tudo a fogo e sangue! Castigo espantoso, horrendum, inefável, imcompreensível: quis novit potestatem irae tuae? (51) Castigo sem misericórdia, judicium sine misericorida (52), sem piedade, sem alívio, sem méritos, sem limite e sem fim. Sim, sem fim: esse pecado mortal de um momento, que cometestes; esse pensamento mau e voluntário, que escapou a vosso conhecimento (53) essa palavra que o vento levou; essa açãozinha contra a lei de Deus, que durou tão pouco, será punida eternamente, enquanto Deus for Deus, com os demônios no inferno, sem que o Deus das vinganças tenha piedade de vossos soluços e de vossas lágrimas, capazes de fender as pedras! Sofrer para sempre sem mérito, sem misericórdia e sem fim!
[23] Será que pensamos nisto, queridos Irmãos e Irmãs, quando sofremos alguma pena neste mundo? Como somos felizes de poder trocar tão vantajosamente uma pena eterna e infrutífera por outra, passageira e meritória, carregando nossa cruz com paciência! Quantas dívidas temos a pagar! Quantos pecados temos, cuja expiação, mesmo após amarga contrição e confissão sincera, será preciso que soframos no purgatório durante séculos inteiros, porque nos contentamos, neste mundo, de penitências leves demais! Ah! Paguemso neste mundo de forma amigável, levando bem nossa cruz! Tudo deverá ser pago rigorosamente no outro, até o último ceitil, mesmo uma palavra ociosa (54). Se pudéssemos arrebatar ao demônio o livro de morte, onde anotou os nossos pecados todos e a pena que lhes corresponde, que grande “debet” verificaríamos, e como nos sentiríamos encantados de sofrer durante anos inteiros neste mundo, para não sofrer um só dia no outro!


Para os Amigos de Deus!

[24] Não vos ufanais, meus Amigos da Cruz, de ser amigos de Deus, ou de tal querer-vos? Resolvei, pois, beber o cálice que é preciso, necesssariamente, beber para se tornar amigo de Deus. Calicem Domini biberunt et amici Dei facti sunt (55). O bem amado Bejamin teve o cálice e seus outros irmãos tiveram apenas o frumento (56). O grande favorito de Jesus Cristo teve o seu Coração, subiu o Calvário e bebeu do cálice (57). Postetis biberi calicem? (58). É bom, desejar a glória de Deus; mas desejá-la e pedi-la sem se resolver a tudo sofrer é fazer um pedido louco e extravagante: necitis quid petatis (59)... Óportet per multas tribulationes (60): é preciso, oportet, é necessidade, é coisa indispensável; é preciso que entremos no reino dos céus por meio de muitas cruzes e tribulações.

Para os filhos de Deus!

[25] Gloria-vos, com razão, de ser filhos de Deus. Gloriai-vos, pois, das chicotadas que esse bom Pai vos deu e há de dar-vos no futuro, porque Ele chicoteia seus filhos (61). Se não sois o número de seus filhos bem amados, sois - ó que desgraça, que golpe fulminante! - sois, como o diz Santo Agostinho, do número dos réprobos. Aquele que não geme neste mundo, como peregrino e estrangeiro, não se regozijará no outro, como cidadão do céu, diz o mesmo Santo Agostinho (62). Se Deus não vos enviar, de tempos a tempos, algumas boas cruzes, é que já não se preocupa convosco, é que está irado contra vós; olha-vos tão somente como um estrangeiro fóra de sua casa e de sua proteção, ou como a um filho bastardo, que, não merecendo sua porção na herança de seu pai, não merece da parte dele nem cuidados nem correção.

Para os que estudam um Deus crucificado!

[26] Amigos da Cruz, que estudais um Deus crucificado, o mistério da cruz é um mistério desconhecido dos Gentíos, repelido pelos Judeus e desprezado pelos hereges e pelos maus católicos; é, porém, o grande mistério que deveis aprender praticamente, na escola de Jesus Cristo, e que somente em sua escola podeis aprender. Procurareis em vão, em todas as academias da antiguidade, um filósofo que vô-lo haja ensinado; consultareis em vão a luz dos sentidos e da razão; não há senão Jesus Cristo que, por sua graça vitoriosa, vos possa ensinar e fazer saborear este mistério.
Tornai-vos hábeis, pois, nesta ciência supereminente, sob a direção de tão grande mestre, e tereis todas as outras ciências, pois ela as contém a todas soberanamente. É ela a nossa filosofia natural e sobrenatural, nossa teologia divina e misteriosa, e nossa pedra filosofal, que muda, pela paciência, os metais mais grosseiros em metais preciosos, as dores mais agudas em delícias, as pobrezas em riquezas, as humilhações mais profundas em glórias. Aquele dentre vós que melhor sabe levar a sua cruz, mesmo que não conheça o A nem o B, é o mais sábio de todos.
Escutai o grande São Paulo, que ao voltar do terceiro céu, onde conheceu mistérios ocultos aos próprios Anjos, exclamava não saber e não querer saber senão Jesus Cristo crucificado (63). Regozijai-vos, pobre idiota, ou pobre mulher sem espírito e sem ciência: se souberdes sofrer alegremente, sabereis mais que um doutor da Sorbonne que não soube sofrer tão bem quanto vós...

Para os Membros de Jesus Cristo!

[27] Sois membros de Jesus Cristo (64). Que honra! Mas quanta  necessidade de sofrer por causa disto! A cabeça está coroada de espinhos e os membros estariam coroados de rosas? A cabeça esta escarnecida e coberta de lama no caminho do Cálvário, e os membros estariam no trono, cobertos de perfumes? A cabeça não tem um travesseiro para repousar e os membros estariam delicadamente deitados entre plumas e arminho? Seria monstruosidade inaudita. Não, não vos enganeis; estes cristãos que vedes de todos os lados, enfeitados na moda, maravilhosamente delicados, excessivamente educados e circunspectos, não são verdadeiros discípulos nem verdadeiros membros de Jesus Cristo Crucificado; faríeis injúria a essa cabeça coroada de espinhos e à verdade do Evangelho se acreditássemos o contrário. Ah! meu Deus! quantos fantasmas de cristãos se consideram membros do Salvador e são meus mais traiçoeiros perseguidores, porque, enquanto fazem com a mão o sinal da cruz, são, de coração, seus inimigos!
Se sois conduzidos pelo mesmo espírito, se viveis da mesma vida que Jesus Cristo, vosso Chefe coberto de espinhos, não espereis senão espinhos, chicotadas, pregos, - numa palavra , cruz - porque é necessário que o discípulo seja tratado como o Mestre e o membro como a cabeça. E se o Chefe vos apresentar, como a Santa Catarina de Sena, uma cora de espinhos e outra de rosas, escolhei com ela a de espinhos, sem hesitar, e ponde-a na cabeça, para vos assemelhar em Cristo.

Para os Templos do Espírito Santo!

[28]Não ignorais que sois os templos vivos do Espírito Santo (65) e que deveis, como outras tantas pedras vivas (66), ser colocadas pelo Deus de Amor no edifício da Jerusalém celeste. Disponde-vos, pois, a ser trabalhados, cortados e cinzelados pelo martelo da cruz; de outra maneira permanceceríeis como pedras brutas que em nada são empregadas, que são desprezadas e repelidas para longe. Tende cuidado para não opor resistência ao martelo que vos bate; prestai atenção ao cinzel que vos talha e à mão que vos molda! - Talvez o hábil e amoroso arquiteto queira fazer de vós uma das primeiras pedras de seu edifício eterno e um dos mais belos retratos de seu reino celeste. Deixai-o fazê-lo, pois. Ele vos amas, sabe o que faz, tem experiência; todos os seus golpes são hábeis e amorosos, nenhum é falso, a menos que o inutilizeis pela vossa impaciência.

[29] O Espírito Santo compara às vezes a cruz a uma peneira, que purifica o grão da palha e das escórias (67): sem resistir, deixai-vos pois, sacudir e agitar, como o grão na peneira; estais na peneira do Pai  de família e dentro em pouco estareis em seu celeiro. Outras vezes Ele a compara ao fogo que tira a ferrugem do ferro pela vivacidade de suas chamas; nosso Deus é um fogo consumidor (68), que pela cruz, permanece numa alma, a fim de purificá-la, sem a consumir, como outrora na sarça ardente (69). Outras vezes a cruz é comparada ao cadinho de uma forja, onde o ouro bom se afirma (70) e o falso desaparece na fumaça: o bom sofrendo pacientemente a provação do fogo, o falso erguendo-se como fumaça contra as chamas. É no candinho da tribulação e da tentação que os verdadeiros amigos da Cruz se purificam pela paciência, enquanto que seus inimigos desaparecem na fumaça por causa de suas impaciências e murmurações.

É preciso sofrer como os santos, como Jesus e Maria.

[30]Olhai, meus queridos Amigos da Cruz, olhai diante de vós uma grande nuvem de testemunhas (71), que provam sem nada dizer, o que vos digo. Vêde, de passagem, o justo Abel assassinado por seu irmão; o justo Abraão estrangeiro na terra, o justo Lot expulso de seu país; o justo Tobias atingido pela cegueira; o justo Jó empobrecido, humilhado e coberto, dos pés à cabeça, por uma chaga.
[31]Olhai tantos Apóstolos e Mártires cobertos com a púrpura de seu sangue; tantas Virgens e Confessores empobrecidos, humilhados, expulsos, desprezados, que com S. Paulo, exclamam: “Olhai nosso bom Jesus autor e consumador da fé (72) que temos nEle e na sua Cruz; foi preciso que Ele sofresse a fim de, pela Cruz, entrar em sua glória (73).
Vêde, ao lado de Jesus Cristo, um agudo gládio que penetra, até o fundo, no coração terno e inocente de Maria, que nunca tivera qualquer pecado, original ou atual. Como me pesa não poder estender-me falando sobre a Paixão de um e de outro, para mostrar que o que sofremos nada é em comparação do que sofreram!
[32]Depois disto, qual de vós poderá eximir-se de levar sua cruz? Qual de vós não voará depressa para os lugares onde sabe que a cruz o espera? Quem não exclamará, com Santo Inácio Mártir: “Que o fogo, o patíbulo, as feras e todos os tormentos do demônio desabem sobre mim, para que eu possa gazar de Jesus Cristo!?”

... ou como réprobos.

[34]Mas, enfim, se não quereis sofrer pacientemente e, como os predestinados, carregar com resignação a vossa cruz, levá-la-eis com murmurações e impaciência, como os réprobos. Sereis semelhantes aos que arrastavam, gemendo, a Arca da Aliança (74). Imitareis Simão de Cirene, que pôs, de má vontade, a mão na Cruz de Jesus Cristo (75) e que murmurava enquanto a levava. Acontecer-vos-á, finalmente, o que aconteceu ao mau ladrão, que, do alto da sua cruz, caiu no fundo do abismo.
Não, não, esta terra maldita em que vivemos não torna ninguém bem-aventurado; não se vê  bem neste país de trevas; nunca se está em perfeita tranqüilidade neste mar tempestuoso; nunca se vive sem combates neste lugar de tentação e neste campo de batalhas; nunca se vive sem pontadas nesta terra coberta de espinhos. É preciso que os predestinados e os réprobos levem a sua cruz, quer seja de boa ou má vontade. Guardai este quatro versos:
Escolhe uma só cruz das que vês no Calvário.
Bem saibas escolher! porquanto é necessário
Que sofras como santo, ou como penitente,
Ou como condenado, eterno descontente!
Quer isto dizer que, se não quiserdes sofrer com alegria, como Jesus Cristo, ou com paciência, como o bom ladrão, tereis, mesmo sem o querer, de sofrer como o mau ladrão. Será preciso que bebais, até as fezes, o mais amargo cálice, sem nenhuma consolação da graça, e que carregueis todo o peso da vossa cruz, sem nenhum auxílio poderoso de Jesus Crito. Será preciso mesmo que leveis o peso fatal que o demônio acrescentará à vossa cruz, pela impaciência em que vos lançará, e que, depois de haverdes sido desgraçado na terra, como o mau ladrão, vades encontrá-lo nas chamas.

b) Nada tão útil e tão doce

[34] Se, ao contrário, porém, sofreis como o deveis, a cruz se tornará em jugo suavíssimo (76), que Jesus Cristo carregará convosco; tornar-se-á as duas asas da alma que a levam para o céu (77); tornar-se-á o mastro de navio que vos fará chegar ao porto da salvação feliz e facilmente.
Levai vossa cruz com paciência e, por esta cruz bem levada, sereis iluminados em vossas trevas espirituais; pois o que não sofre pela tentação nada sabe (78).

Levai vossa cruz com alegria e sereis abrasados pelo amor divino, porque
Ninguém pode viver sem dor
No puro amor do Salvador (79)

Só se colhem rosas entre espinhos. Só a cruz alimenta o amor de Deus, como a madeira alimenta o fogo (80). Lembrai-vos, pois, desta bela máxima do livro da “Imitação”: Quanto mais vos fizerdes violência, sofrendo pacientemente, tanto mais progredireis (81) no amor divino. Nada de grande espereis dessas almas delicadas e preguiçosas que recusam a cruz quando delas se aproxima, e que só com discreção procuram uma cruz. Trate-se de terra não cultivada, que só dará espinhos, porque não foi sulcada, nem batida, nem removida por um lavrador experiente; trata-se de água estagnada, que não serve para lavar nem beber.
Levai a vossa cruz alegremente e nela encontrareis uma força vitoriosa, a que nenhum dos vossos inimigos poderá resistir (82) e experimentareis uma sublime doçura à qual nada se pode comparar. Sim, meus Irmãos, sabei que o verdadeiro paraíso terreste consiste em sofrer alguma coisa por Jesus Cristo. Interrogai todos os santos: dir-vos-ão que nunca provaram festim mais delicioso para a alma do que quando sofreram os maiores tormentos. Que todos os tormentos do demônio desabem sobre mim! dizia Santo Inácio Mártir. Ou sofrer, ou morrer, dizia Santa Madalena de Pazzi. Sofrer e ser desprezado por Ti, dizia o bem-aventurado João da Cruz (83); e muitos outros usaram de expressões semelhantes, como se lê em suas vidas (84).
Crêde-me, por Deus, meus caros Irmãos: Quando se sofre alegremente por Deus, diz o Espírito Santo, é causa de toda sorte de alegrias (85) para toda espécie de pessoas. A alegria da cruz é maior que a de um pobre a quem se cumulasse de todas as riquezas; do que a de um camponês que fosse elevado ao trono; do que a de um negociante que lucrasse milhões; que a dos generais após a vitória; que a dos cativos libertados de seus ferros. Imaginai, finalmente, todas as maiores alegrias deste mundo: a de uma pessoa crucificada, que sabe sofrer bem, contém-nas todas e a todas ultrapassa.

c) Nada tão glorioso

[35] Regozijai-vos, pois, e estremecei de alegria quando Deus vos der por partilha alguma boa cruz, pois o que há de maior, no Céu e no próprio Deus, desce sobre vós sem que o percebais. Que grande presente de Deus é a Cruz! Se o compreendesseis, faríeis celebrar Missas, rezaríeis novenas diante dos túmulos dos santos e empreenderíeis longas viagens, como os santos o fizeram, para obter do Céu este divino presente.

[36] O mundo a chama de loucura, infâmia, tolice, indiscreção, imprudência. Deixai falar a estes cegos: sua cegueira, que os faz olhar a cruz como homens, e toda deformada, constitui uma parte de nossa glória. Todas as vezes que nos proporcionam algumas cruzes, pelo seu desprezo e pelas suas perseguições, estão a nos dar jóias, a colocar-nos em um trono e a coroar-nos de louros.

[37]Que digo? Nem mesmo todas as riquezas, honras, cetros e coroas brilhantes dos potentados e dos imperadores podem ser comparadas à glória da cruz, diz S. João Crisóstomo (86); ela ultrapassa a glória de ser apóstolo e escritor sacro. “Deixaria de bom grado o Céu, se pudesse escolher, -diz este santo homem iluminado pelo Espírito Santo, - para sofrer pelo Deus do Céu (87). Preferiria os cárceres e as prisões aos tronos do empíreo; não invejo tanto a glória dos Serafins quanto as maiores cruzes. Estimo menos o dom dos milagres, pelo qual se ordena aos demônios, se abala os elementos, faz-se parar o sol e dá-se vida aos mortos, do que estimo a honra dos sofrimentos. S. Pedro e S. Paulo são mais gloriosos em seus cárceres, com ferros aos pés, do que por se elevar ao terceiro céu e receber as chaves do paraíso”.

[38] Com efeito, não foi a Cruz que deu a Jesus Cristo “um nome acima de todo nome, a fim de que ao nome de Jesus todo joelho se dobre, no céu, na terra e nos infernos?” (88) A glória de uma pessoa que sofre bem é tão grande, que no céu, os anjos, os homens e o próprio Deus do Céu a contemplam com alegria, como ao mais glorioso dos espetáculos, e se os santos pudessem desejar alguma coisa, seria de voltar à terra para carregar algumas cruzes.

[39] Se esta glória, porém, é tão grande mesmo na terra, qual será então a do céu? Quem explicará e compreenderá jamais o peso eterno de glória que resultará de um só momento em que levarmos bem a cruz? (89) Quem compreenderá a glória que teremos no Céu por causa de um ano e, às vezes, de uma vida inteira de cruzes e de dores?

[40] Seguramente, meus caros Amigos da Cruz, o céu vos prepara para algo de grande, disse-vos um grande santo, já que o Espírito Santo vos une tão estreitamente a uma coisa de que todos fogem com tanto cuidado. Seguramente Deus quer fazer tantos santos e santas quantos são os Amigos da Cruz, se fordes fiéis à vossa vocação, se carregardes a vossa cruz como deveis e como Jesus Cristo a carregou.

4º - Nas Pegadas de Jesus Cristo: ... “E Me Siga!”

É preciso sofrer á maneira de Jesus Cristo.

[41] Não é, porém, suficiente sofrer: o demônio e o mundo tem, seus mártires; é preciso sofrer e levar a cruz nas pegadas de Jesus Cristo: - sequatur me! que me siga! - ou seja, da maneira que Ele a carregou. E eis, para isto, as regras que deveis seguir:

As quatorze regras

Não procurar cruzes propositadamente ou pela própria culpa.

[42] 1º: Não procureis cruzes propositadamente ou por vossa culpa; não se deve fazer o mal para que dele resulte um bem (90); não se deve, sem inspiração especial, fazer as coisas de maneira má, para atrair sobre si mesmo o desprezo dos homens. É antes preciso imitar Jesus Cristo, de quem se disse fez bem todas as coisas (91), não por amor próprio ou por vaidade, mas para agradar a Deus e conquistar a alma do próximo. E se  executardes os vossos trabalhos o melhor que puderdes, não vos hão de faltar contradições, perseguições, nem desprezos, que a Divina Providência vos enviará contra vossa vontade e sem vos consultar.

Consultar o bem do próximo.

[43] 2º: Se praticais algum ato indiferente, mas do qual o próximo se escandaliza, ainda que fora de propósito, abstende-vos dele, por caridade, para que cesse o escândalo dos pequenos; o ato heróico de caridade que praticardes nessa ocasião vale infinitamente mais do que aquilo que fazíeis ou pretendíeis fazer.
Se, entretanto, o bem que fazeis é necessário ou útil ao próximo, e escandalizar, sem razão, algum fariseu ou mau espírito, consultai uma pessoa prudente, para saber se o que fazeis é necessário e muito útil ao bem do próximo; e, se ela assim o julgar, continuai e deixai falar, contanto que vos deixem agir, e respondei, em tais ocasiões, o que Nosso Senhor respondeu a alguns de seus discípulos que vieram dizer-lhe que os Fariseus se haviam escandalizado com as suas palavras e ações: “Deixai-os falar. São cegos”. (92).

Admirar, sem pretender atingí-la, a sublime virtude dos santos.

[44] 3º: Apesar de alguns santos e pessoas importantes terem pedido, procurado e, por meio de ações ridículas, atraído sobre si mesmos, cruzes, desprezos e humilhações, adoremos e admiremos apenas a ação do Espírito Santo sobre suas almas e humilhemo-nos diante de tão sublime virtude, sem ousar voar tão alto, um vez que, comparados a essas rápidas águias e rugidores leões, não passamos de criaturas sem coragem e sem força de vontade. (93)

Pedir a Deus a sabedoria da Cruz.

[45] 4º: Podeis, entretanto, e mesmo o deveis, pedir a sabedoria da cruz, que é uma ciência saborosa e experimental da verdade, que nos faz ver, à luz da fé, os mais ocultos mistérios, entre os quais o da cruz, e isto só se obtem mediante grandes trabalhos, profundas humilhações e orações fervorosas. Se precisardes do espírito principal (94), que nos faz levar corajosamente as mais pesadas cruzes; do espírito bom (95) e manso, que nos faz saborear, na parte superior da alma, as mais repugnantes amarguras; do espírito são e reto (96), que procura só a Deus; da ciência da cruz, que encerra todas as coisas; numa palavra, do tesouro infinito cujo bom emprego torna a alma participante da amizade de Deus (97), pedi a sabedoria; pedi-a incessante e fortemente, sem hesitar (98), sem receio de não a obter, e ela vos será dada, infalivelmente, e em seguida vereis claramente, por experiência própria, como pode ser possível desejar, procurar e saborear a cruz.

Humilhar-se das próprias faltas, sem se perturbar.

[46] 5º: Quando, por ignorância ou mesmo por vossa culpa, cometerdes algum erro de que resulte para vós alguma cruz, humilhai-vos imediatamente diante de vós mesmos, sob a mão poderosa de Deus (99), sem vos perturbar voluntariamente, dizendo: “Eis, Senhor, uma peça que me pregou meu ofício”! E se houver pecado na falta que cometestes, aceitai a humilhação de vosso orgulho. Algumas vezes, e até muitas veses, Deus permite que seus maiores servos, os mais elevados em graça, cometam as faltas mais humilhantes, a fim de humilhá-los aos seus próprios olhos e aos olhos dos homens, a fim de tirar-lhes a vista e o pensamento orgulhoso das graças que lhes dá e do bem que fazem, a fim de que, segundo a palavra do Espírito Santo, nenhuma carne se glorifique diante de Deus (100).

Deus nos humilha para purificar-nos

[47] 6º: Ficai bem persuadidos de que tudo o que existe em nós está inteiramente corrompido (101) pelo pecado de Adão e pelos pecados atuais; e não apenas os sentidos do corpo, mas todas as potências da alma; e que, logo que o nosso espírito corrompido olha, refletida e complacentemente, algum dom de Deus em nós, esse dom, ação ou graça fica todo poluído e corrompido e Deus dele desvia os seus olhos divinos. Se os olhares e os pensamentos do espírito do homem estragam assim as melhores ações e os mais divinos dons, que diremos dos atos da própria vontade, que são ainda mais corrompidos que os do espírito? (102)
Não é de espantar, depois disto, que Deus sinta prazer em esconder os seus no segredo de sua face (103), para que não sejam manchados pelos olhares dos homens e pelos seus próprios conhecimentos. E, para escondê-los assim, o que não faz e não permite este Deus ciumento?! Quantas humilhações lhes proporciona!
Em quantas faltas os deixa cair! De que tentações permite sejam atacados, como S. Paulo! (104) Em que incertezas, trevas e perplexidade os deixa! Ah! como Deus é admirável nos seus santos e nos caminho pelos quais os conduz à humildade e à santidade!

Evitar nas cruzes, o perigo do orgulho.

[48] 7º: Procurai bem, portanto, evitar crer, como os devotos orgulhosos e cheios de si, que vossas cruzes são grandes, que são provas de vossa fidelidade e testemunhas de um singular amor de Deus para convosco. Esta armadilha do orgulho espiritual é muito sutil e delicada, mas cheia de veneno. Deveis crer: 1) que vosso orgulho e moleza vos levam a considerar palhas como se fossem traves; picadas como se fossem chagas, um rato como se fosse um elefante; e uma palavrinha no ar, - um nada, na verdade, - como se fosse uma injúria atroz e um cruel abandono; 2) que as cruzes que Deus vos envia são antes castigos amorosos de vossos pecados, - e de fato o são, - que sinais de especial benevolência; 3) que, seja qual for a cruz que Ele vos enviar, ainda assim vos poupa infinitamente, em virtude do número e da enormidade dos vossos crimes, que só deveis considerar à luz da santidade de Deus, que nada de impuro tolera e que atacastes; à luz de um Deus moribundo e aniquilado de dor, por causa de vosso pecado, e à luz de um inferno sem fim, que merecestes mil vezes e talvez cem mil; 4) que na paciência com que sofreis há muito mais de humano e natural do que o julgais: provam-no as pequenas mitigações; as procuras secretas de consolação; as aberturas de coração, - tão naturais, - a vossos amigos e, talvez, ao vosso diretor; as desculpas tão finas e prontas; as queixas, ou melhor, as maledicências tão bem urdidas e tão caridosamente expressas, contra os que vos fizeram algum mal; as referências e complacências delicadas para com vossos males; a crença de Lúcifer de que sois algo de grande (105), etc. Nunca terminaria se me fosse necessário descrever as voltas e reviravoltas da natureza, mesmo nos sofrimentos.

Tirar maior proveito dos pequenos sofrimentos que dos grandes.

[49] 8º: Tirai proveito dos pequenos sofrimentos e mesmo mais que dos grandes. Deus não olha tanto o sofrimento quanto a maneira por que se sofre. Sofrer muito e mal é sofrer como condenado; sofrer muito e corajosamente, mas por uma causa má, é sofrer como mártir do demônio; sofrer pouco ou muito, mas sofrer por Deus, é sofrer como santo.
Se é verdade que se pode escolher as cruzes, isto é mais certo quanto às cruzes pequenas e escondidas quando nos vêm paralelamente às grandes e visíveis (106). O orgulho da natureza pode pedir, procurar e mesmo escolher e abraçar as cruzes grandes e visíveis; mas escolher e levar bem alegremente as cruzes pequenas e ocultas só pode ser o efeito de uma grande graça e de uma grande fidelidade a Deus. Fazei, pois, como o comerciante com o seu negócio: tirai proveito de tudo, não deixeis perder-se a mínima parcela da verdadeira Cruz, mesmo que seja uma picada de mosca ou de alfinete, a indelicadeza de um vizinho, uma injúria por descuido, a perda de um níquel, uma perturbaçãozinha da alma, um leve cansaço do corpo, uma dorzinha num dos membros, etc. Tirai proveito de tudo, como o merceeiro em sua mercearia, e, assim como ele enriquece em dinheiro, juntando moeda por moeda em seu cofre, breve estareis ricos em Deus. Ao menor contratempo que sobrevier, dizei: “Deus seja bendito! - (107) Meu Deus, eu Vos agradeço”, depois escondei na memória de Deus, que é vosso cofre, a cruz que acabais de ganhar, e só vos lembreis dela para dizer: Obrigado! ou Misericórdia!

Amar a cruz, não com amor sensível, mas racional e sobrenatural.

[50] 9º: Quando vos dizemos para amar a cruz, não falamos em amor sensível, que é impossível à natureza. Distingui bem, portanto, estes três amores: o amor sensível, o amor racional, o amor fiel e supremo; ou, em outras palavras: o amor da parte inferior, que é a carne; o amor da parte superior, que é a razão; e o amor da parte suprema, ou cimo da alma, que é a inteligência esclarecida pela fé.

[51] Deus não vos pede que ameis a cruz com a vontade da carne. Sendo ela inteiramente corrompida e criminosa, tudo o que dela se origina é corrompido e ela não pode, por si mesma, estar sujeita à vontade de Deus e à sua lei crucificadora. Eis por que, ao falar dela no Horto da Oliveiras, Nosso Senhor exclama: “Meu Pai, seja feita a Vossa vontade e não a minha!” (108) Se a parte inferior do homem em Jesus Cristo, ainda que santa, não pôde amar a cruz sem desfalecimento, com mais forte razão a nossa, que é toda corrompida, há de a repelir. Podemos, é verdade, experimentar, por vezes, até mesmo alegria sensível pelo que sofremos, como aconteceu a vários santos; mas essa alegria não vem da carne, ainda que nela esteja; vem apenas da parte superior, que se acha tão cheia da divina alegria do Espírito Santo, que a faz estender-se até à parte inferior, de tal sorte que em tal ocasião até mesmo a pessoa mais crucificada pode dizer: Meu coração e minha carne estremeceram de alegria no Deus vivo! (109)

[52] Há outra espécie de amor, que denomino racional, e que se acha na parte superior, que é a razão. Este amor é todo espiritual e, como nasce do conhecimento da felicidade de sofrer por Deus, é perceptível e mesmo percebido pela alma, rejubilando-a interiormente e fortificando-a. Este amor racional e percebido, porém, -apesar de bom, e de muito bom, - nem sempre é necessário para que se sofra alegre e divinamente.

[53] É porque há outro amor, do cimo ou ápice da alma, dizem os mestres da vida espiritual, - ou da inteligência, afirmam os filósofos, - pelo qual, sem experimentar qualquer alegria dos sentidos, sem perceber nenhum prazer racional na alma, é possível amar e saborear, pela visão da fé pura, a cruz que carregamos, muito embora tudo esteja em guerra e estado de alarme na parte inferior, que geme, se queixa, chora e procura lenitivo, de tal sorte que se possa dizer, como Jesus Cristo: “Meu Pai, seja feita a Vossa vontade e não a minha!” ou, com a Santíssima Virgem: “Eis aqui a escrava do Senhor. Faça-se em mim segundo a Vossa palavra!” É com um desses dois amores da parte seperior que devemos amar e aceitar a cruz.

Sofrer toda sorte de cruzes, sem excepção e sem escolha.

[54] 10º: Decidi-vos, queridos Amigos da Cruz, a sofrer toda sorte de cruzes, sem excepção e sem escolha: toda pobreza, toda injustiça, toda humilhação, toda contradição, toda calúnia, toda aridez, todo abandono, toda pena interior ou exterior, dizendo sempre: Meu coração está preparado, meu Deus, meu coração está preparado (110). Preparai-vos, pois, para ser abandonados pelos homens, pelos anjos e pelo próprio Deus; para ser perseguidos, invejados, traídos, cluniados, desacreditados e abandonados por todos; para sofrer fome, sêde, mendicidade, nudez, exílio, prisão, tortura e todos os suplícios, ainda que não os tenhais merecido pelos crimes que vos impuserem (111). Imaginai enfim que, depois de ter perdido vossos bens e vossa honra, de haver sido lançados para fora de vossa casa, como Jó e Santa Isabel, rainha da Hungria, vos joguem na lama, como àquela santa, e vos arrastem por sobre o estrume, como a Jó, todo purulento e coberto de úlceras, sem vos darem ataduras para vossas chagas ou, para comerdes, um pedaço de pão que não recusariam a um cavalo ou a um cão; e que, além desses males extremos, Deus vos deixe à mercê de todas as tentações dos demônios, sem derramar sobre vossa alma a mínima consolação sensível.
Crêde firmemente que esse é o ponto supremo da glória divina e a felicidade perfeita de um verdadeiro e perfeito Amigo da Cruz (112).

Os quatro estimulantes do bom sofrimento.

[55] 11º: Para ajudar-vos a sofrer bem, tomai o santo hábito de olhar quatro coisas:

1º) O olhar de Deus

Primeiramente o olhar de Deus, que, como um grande rei, do alto de uma torre, olha complacentemente e louvando-lhe a coragem, o seu soldado que peleja.
Que olhará Deus na terra? Os reis e imperadores em seus tronos? Muitas vezes Ele os contempla com desprezo. As grandes vitórias dos exércitos do Estado? As pedras preciosas? Numa palavra: as coisas que são grandes aos olhos dos homens? O que é grande aos olhos dos homens é abominação diante de Deus (113) Que olhará Ele então com prazer e complacência e de que pedirá notícias aos anjos e aos próprios demônios? Um homem que, por Deus, se bate com a sorte, o mundo, o inferno e ele próprio, um homem que carrega alegremente a sua cruz. Não viste na terra uma grande maravilha que todo o céu contempla com admiração?, disse o Senhor a Satanás: “Não viste meu servo Jó”(114), que sofre por mim?

2º) A mão de Deus

[56] Em segundo lugar, considerai a mão deste poderoso Senhor, que permite todo o mal que da natureza nos advém, desde o maior até o menor; a mão que colocou um exército de cem mil homens no campo de batalha (115) e faz cair as folhas das árvores e os cabelos de vossa cabeça (116); a mão que, havendo rudemente atingido Jó, vos toca docemente pelo pouco sofrimento que vos envia. Com essa mão Ele formou o dia e a noite, o sol e as trevas, o bem e o mal; permitiu os pecados que se cometem e que vos melindram; não lhes fez a malícia, porém lhes permitiu a ação.
Assim, quando virdes um Sémei injuriar-vos e apedrejar-vos, como ao rei Davi, (117) dizei a vós mesmos: “Não nos vinguemos. Deixemo-lo, porque o Senhor lhe ordenou de agir assim. Sei que mereci toda sorte de utrajes e é justo que Deus me castigue. Parai, braços meus: Parai, língua minha. Não ataqueis. Nada digais. Este homem ou esta mulher me injuriam por palavras ou por obras; são embaixadores de Deus, que vêm de sua misericórdia, para exercer vingança amistosa. Não irritemos sua justiça usurpando os direitos de sua vingança; não desprezemos a sua misericórdia resistindo às suas amorosas chicotadas, para que ela não nos reconduza, por vingança, à pura justiça da eternidade.”
Olhai uma das mãos de Deus, que, onipotente e infinitamente prudente, vos sustenta, enquanto a outra vos atinge; com uma das mãos Ele mortifica e com a outra vivifica; rebaixa e exalta, e, com seus dois braços, doce e fortemente, alcança, de um polo ao outro, a vossa vida (118); docemente, não permitindo que sejais tentados e provocados acima de vossas forças: - fortemente, secundando-vos com graça poderosa e correspondente à violência e duração da tentação e da aflição; fortemente, ainda uma vez, tornando-se Ele próprio, segundo o diz pelo espírito de sua Santa Igreja, “vosso apoio à borda do precipício perto do qual vos encontrais, vosso companheiro no caminho onde vos perdeis, vossa sombra no calor que vos caustica, vossa vestimenta na chuva que vos molha e no frio que vos enregela; vossa carruagem na fadiga que vos aniquila, vosso socorro na adversidade que vos visita, vosso bastão nos caminhos escorregadios e vosso porto no meio das tempestades que vos ameaçam de ruína e naufrágio”(119).

3º) As chagas e as dores de Jesus Cristo Crucificado

[57] Em terceiro lugar, olhai as chagas e as dores de Jesus Cristo Crucificado. Ele mesmo vô-lo diz: “Ó vós que passais pelo caminho espinhoso e crucificado por que passei, olhai e vêde: olhai com os próprios olhos do vosso corpo e vêde, com os olhos de vossa contemplação, se vossa pobreza, vossa nudez, vosso desprezo, vossas dores, vossos abandonos são semelhantes aos meus; olhai-me, a mim que sou inocente, e queixai-vos, vós que sois culpados!” (120).
O Espírito Santo nos ordena, pela boca dos Apóstolos, esta mesma contemplação de Jesus Crucificado (121); ordena que nos armemos com este pensamento(122) mais penetrante e terrível para todos os nossos inimigos que todas as outras armas. Quando fordes atacados pela pobreza, pela abjeção, pela dor, pela tentação e pelas cruzes, armai-vos com um escudo, uma couraça, um capacete e uma espada de dois gumes (123), a saber: o pensamento de Jesus Crucificado. Eis a solução de toda dificuldade e a vitória sobre qualquer inimigo.

4º) Ao alto, o céu; em baixo o inferno.

[58] Em quarto lugar olhai, ao alto, a bela coroa que vos espera no céu, se carregardes bem vossa cruz. Foi esta recompensa que sustentou os patriarcas e os profetas em sua fé e nas perseguições; que animou os Apóstolos e os Mártires em seus trabalhos e tormentos. Preferimos - diziam os Patriarcas, com Moisés - sofrer aflições com o povo de Deus, para ser feliz com Ele eternamente, que gozar de um prazer criminoso por um só momento (124). Sofremos grandes perseguições por causa da recompensa (125), diziam os profetas com Davi.
Somos como vítimas destinadas à morte, como espetáculo para o mundo, os anjos e os homens pelos nossos sofrimentos, como a escória e o anátema do mundo (126), diziam os Apóstolos e os Mártires com São Paulo, por causa do peso imenso da Glória eterna que este momento de breve sofrimento produz em nós (127).
Olhemos sobre nossas cabeças os anjos que nos dizem, em alta vos: “Tende cuidado para não perderdes a coroa marcada pela cruz que vos é dada, se a levardes bem. Se não a carregardes bem, outro o fará e vos arrebatará vossa coroa (128). Combatei fortemente, sofrendo com paciência, dizem-nos todos os santos, e entrareis no reino eterno (129)”. Ouçamos enfim Jesus Cristo, que nos diz: “Só darei minha recompensa àquele que sofrer e vencer pela paciência (130)”.
Olhamos embaixo o lugar que merecemos e que nos espera no inferno com o mau ladrão e os réprobos, se, como eles, sofremos com murmurações, despeito e vingança. Exclamemos com Santo Agostinho: “Queimai, Senhor, cortai, talhai e retalhai neste mundo para castigar meus pecados, contanto que os perdoeis na eternidade”!

Nunca se queixar da criaturas.

[59] 12º: Nunca vos queixeis voluntariamente e entre murmurações, das criaturas de que Deus se serve para vos aflingir. Distingui, para tanto, três espécies de queixas nos sofrimentos.
- A primeira é involuntária e natural: é a do corpo que geme, suspira, se queixa, chora e se lamenta. Quando a alma, como já disse, está resignada com a vontade de Deus, em sua parte superior, não há nenhum pecado.
- A segunda é razoável; é quando alguém se queixa e descobre seu mal aos que podem e devem tratá-lo, como um superior ou o médico. Esta queixa pode ser imperfeita, quando for muito insistente; mas não é pecado.
- A terceira é criminosa: é quando alguém se queixa do próximo para se isentar do mal que ele nos faz sofrer, ou para se vingar; ou quando alguém se queixa da dor que sofre, consetindo nessa queixa e juntado a ela a impaciência e a murmuração.

Receber sempre a cruz com reconhecimento.

[60] 13º: Nunca recebais nenhuma cruz sem beijá-la humildemente e com reconhecimento; e quando Deus, todo bondade, vos houver favorecido com alguma cruz um pouco considerável, agradecei-lhe de maneira especial e fazei-o agradecer por outros, a exemplo daquela pobre mulher, que, tendo perdido todos os seus bens em virtude de um processo injusto que lhe moveram, fez celebrar imediatamente uma Missa, com o  dinheiro que lhe restava, a fim de agradecer a Deus a ventura que lhe era concedida (131).

Carregar suas cruzes voluntárias.
[61] 14º: Se quereis tornar-vos dignos de receber as cruzes que vos hão de vir sem vossa participação e que são as melhores, carregai outras voluntárias, seguindo os conselhos de um bom diretor.
Por exemplo: Tendes em casa algum móvel inútil pelo qual tendes afeição? Dai-o aos pobres, dizendo: quererias o supérfluo quando Jesus é tão pobre?
Tendes horror a algum alimento? A algum ato de virtude? A algum mau odor? Provai-o, praticai-o, aspirai-o. Vencei-vos.
Amais alguém ou algum objeto um pouco terna e insistentemente demais? Ausentai-vos, privai-vos, afastai-vos do que vos lisonjeia.
Tendes uma natureza muito inclinada a ver? A agir? A aparecer? A ir a algum lugar? Parai, calai, escondei-vos, desviai os olhos.
Odiais naturalmente algum objeto? Alguma pessoa? Procurai-a frequentemente. Dominai-vos.

[62] Se sois verdadeiramente Amigos da Cruz, o amor, que é sempre industrioso, vos fará assim encotrar mil pequenas cruzes, com que vos enriqueceis insensívelmente, sem temor da vaidade, que se mistura tão frequentemente à paciência com que suportamos as cruzes muito visíveis; e porque fostes assim fiéis em pouca coisa, o Senhor vos estabelecerá em muito (132), como o prometeu; isto é, em muitas cruzes que vos enviará, em muita glória que vos preparará (133) ...















Cântico (134)

O Triunfo da Cruz (135)

I
É a Cruz, sobre a terra, mistério profundíssimo, que não se conhece sem muitas luzes. Para compreendê-lo é necessário um espírito elevado. Entretanto, é preciso entendê-la para que nos possamos salvar.

II
A natureza a abomina, a razão a combate; o sábio a ignora e o demônio a aniquila. Muitas vezes o próprio devoto não a tem no coração e, embora diga que a ama, no fundo é um mentiroso.

III
A cruz é necessária. É preciso sofrer sempre: ou subir o Calvário ou perecer eternamente. E Santo Agostinho exclama que somos réprobos se Deus não nos castiga e nos prova.

IV
Vai-se para a Pátria pelo caminho das cruzes, que é o caminho da vida e o caminho dos reis; toda pedra é talhada proporcionalmente para ser colocada na Santa Sião.

V
De que servirá a vitória ao maior conquistador, se não tiver a glória de vencer-se sofrendo, se não tiver por modelo Jesus morto na Cruz, se, como um infiel, o lenho repelir?

VI
Jesus Cristo por ela acorrentou o inferno, aniquilou o rebelde e conquistou o universo; e Ela a dá como arma aos seus bons servidores; ela encanta ou desarma as mãos e os corações.

VII
Por este sinal vencerás, disse Ele a Constantino. Toda vitória insigne se encontra nela. Lêde, na história, seus efeitos maravilhosos, suas vitórias estupendas na terra e nos céus.

VIII
Embora contra os sentidos e a natureza, a política e a razão, a verdade nos assegura que a cruz é um grande dom. É nesta princesa que encontramos, em verdade, graça, sabedoria e divindade.

IX
Deus não pôde defender-se contra sua rara beleza. A Cruz o fez baixar à nossa humanidade. Ao vir ao mundo Ele disse: “Sim, quero-a, Senhor. Boa Cruz, coloco-vos bem dentro do coração”.

X
Pareceu-lhe tão bela que nela pôs a sua honra, tornando-a a sua eterna companheira e a espôsa de seu Coração. Desde a mais terna infância seu Coração suspirava unicamente pela presença da cruz que amava.

XI
Desde a juventude, ansioso a procurou. De ternura e de amor, em seus braços morreu. “Desejo um batismo”, exclamou Ele um dia: “a Cruz querida que amo, o objeto de meu amor!”

XII
Chamou a São Pedro Satanás escandaloso, quando ele tentou desviar Seus olhos da Cruz aqui na terra. Sua Cruz é adorável, sua mãe não o é. Ó grandeza inefável, que a terra desconhece!

XIII
Esta cruz, dispersa por tantos lugares da terra, será ressuscitada e transportada para os Céus. A cruz, sobre uma nuvem cheia de brilho rutilante, julgará, por sua visão, os vivos e os mortos.

XIV
Clamará vingança contra seus inimigos, alegria e indulgência para todos os seus amigos. Dará glória a todos os bem-aventurados e cantará vitória na terra e nos céus.

XV
Durante sua vida os santos só procuraram a cruz, seu grande desejo e sua escolha única. E, não contentes de ter as cruzes que lhes dava o céu, a outras, inteiramente novas, cada um se condenava.

XVI
Para São Pedro, as cadeias constituíam honra maior do que ser o vigário de Cristo na terra. “Ó boa Cruz”, exclamava, cheio de fé, Santo André: “Que eu morra em ti, para que me dês a vida!”

XVII
E vêde, São Paulo esquecia seu grande êxtase para se glorificar tão somente na cruz. Sentia-se mais honrado em seus cárceres horrendos que no êxtase admirável que o arrebatou aos céus.

XVIII
Sem a cruz a alma se torna lenta, mole, covarde e sem coração. A cruz a torna fervorosa e cheia de vigor. Permanecemos  na ignorância quando nada sofremos. Temos inteligência quando sofremos bem.

XIX
Uma alma sem provações não tem grande valor. É a alma nova ainda, que nada aprendeu. Ah! que doçura suprema goza o aflito que se rejubila com sua pena e dela não é aliviado!



XX
É pela Cruz que se dá a bênção, é por ela que Deus nos perdoa e concede remissão. Ele quer que todas as coisas tragam este selo, sem o qual nada lhe parece belo.

XXI
Colocada a cruz em algum lugar, torna-se sagrado o profano e desaparecem as manchas, porque Deus delas se apodera. Ele quer a Cruz em nossa fronte e em nosso coração, antes de todos os atos, para que sejamos vencedores.

XXII
Ela é nossa proteção, segurança, perfeição e única esperança. É tão preciosa que uma alma que já está no céu voltaria alegremente à terra para sofrer.

XXIII
Tem este sinal tantos encantos, que no altar o sacerdote não se vale de outras armas para atrair Deus lá do céu. Faz sobre a hóstia vários sinais da Cruz e, por esses sinais de vida, dita-lhe suas leis.

XXIV
Por este sinal adorável prepara-lhe um perfume cujo odor agradável nada tem de comum; é o incenso que lhe dá uma vez consagrado, e é com esta coroa que desejaria ser ornado.

XXV
A Eterna Sabedoria procura, ainda hoje, um coração bem fiel, digno deste presente. Quer um verdadeiro sábio, que goste apenas de sofrer e, com coragem, leve a sua cruz até morrer.

XXVI
Devo calar-me, ó Cruz, rebaixo-te ao falar. Sou um temerário e um insolente; já que te recebi de coração constrangido e não te conheci, perdoa meu pecado!

XXVII
Ó Cruz querida, já que nesta hora te conheço, faze de mim tua morada e dita-me tuas leis. Cumula-me, ó princesa minha, com teus castos amores, e faze que eu conheça os teus mais secretos encantos!

XXVIII
Ao ver-te tão bela, bem queria possuir-te, mas meu coração infiel me prende ao meu dever; se queres, Senhora minha, animar meu langor e sustentar minha fraqueza, dou-te o meu coração.

XXIX
Tomo-te para minha vida, meu prazer e minha honra, minha única ventura. Imprime-te, eu te rogo, em meu coração e no meu braço, na minha fronte e na minha face. Não me envergonharei de ti!

XXX
Tomo, para minha riqueza, tua rica pobreza, e, por ternura, tuas doces austeridades. Que tua prudente loucara e tua santa desonra sejam toda a glória e grandeza de minha vida!

XXXI
Minha vitória estará em ser derrotado por tua virtude e para tua maior glória. Não sou, porém, digno de morrer sob teus golpes, nem de ser contrariado por todos.

Índice

Prefácio...............................................................................................................................
Aos Amigos da Cruz..........................................................................................................
Cântico: O Triunfo da Cruz.............................................................................................
Notas explicativas..............................................................................................................




NOTAS EXPLICATIVAS

(1) Este primeiro parágrafo foi retirado do manuscrito do R.P., Besnard. As duas expressões “a excelência” e “as práticas” anunciam imediatamente a intenção do apóstolo, bem como as “duas partes” da carta que escreve aos seus queridos Amigos da Cruz, dada a impossibilidade de falar-lhes. Como bom filósofo, dir-lhes-á, antes de mais nada, o que são pela graça de Deus, a fim de levá-los a agir como verdadeiros Amigos da Cruz. - Que este vocábulo não amedronte o leitor! -

“É este, dirá Montfort, o nome inequívoco de um cristão”. Dirige-se ele, com efeito, a cristãos que compreenderam a grandeza de sua vocação e a ela querem conformar sua vida. A “Carta” tem como fim único ajudá-los a compreender melhor e a melhor viver o programa da perfeição cristã. Possa ela ainda achar, em nossos dias, numerosos leitores ávidos de realizar a verdade de seu cristianismo! As próprias almas consagradas, apesar de esta “Carta” não ter sido escrita em sua intenção, poderão nela alimentar seu fervor.
(2) - Que confiança inspira o escritor que emprega tal linguagem!

(3) Hoje falaríamos cruzados. Essa idéia de cruzada obceca a grande alma de Montfort (cfr. “O Segredo admirável do Santo Rosário” e a “Oração abrasada”, principalmente nas últimas páginas).

(4) Sois uma raça eleita, um sacerdócio real, uma nação santa, um povo que Deus formou”(I Pedro, 2-9). Estas palavras inspiradas, que caracterizam o povo cristão em sua sublime vocação, Montfort as aplica especialmente a essa elite que seus discípulos devem constituir. “Na literatura espiritual poucas páginas tem tanto brilho quanto aquela em que ele se esforça para definir o que é um Amigo da Cruz”. (Mons. Villepelet, bispo de Nantes”. “Carta de Quaresma”, 1942).

(5) Fil., 3, 20.

(6) Montfort, tal como São Francisco de Assis, tinha um coração apaixonado pela beleza e, em sua gruta de Mervent, cantou deliciosamente a natureza. Não prende, porém, a ela a sua alma: ama-a tão somente na medida em que ela o eleva a una a Deus.

(7) Aplicação de dois nomes dados ao último filho do Patriarca: um por sua mãe Raquel, outro por seu pai Jacó (Gen., 35, 18).

(8) Estais mortos, com efeito, e vossa vida é toda oculta em Deus com Jesus Cristo (Col., 3, 3).

(9) Gal., 2,20.

(10) Prov., 6, 23, 10, 17, 15, 10; Jer., 21, 8.

(11) Maldição, maldição, maldição aos habitantes da terra... (Apoc., 8, 13).

(12) Is., 48, 20; 52, 51; Jer., 50, 8; 51, 6, 9, 45; Apoc., 48, 4.

(13) “Não peço pelo mundo..” (Jo., 17-9)

(14) Ele convencerá o mundo do pecado, da justiça e do julgamento (Jo., 16, 8-12).

(15) Comparai o Salmo 1, 1: “Feliz o homem que não anda segundo o conselho dos maus e que não permanece no caminho dos pecadores, nem se senta nunca no lugar de corrupção”.

(16) Is., 48, 20; Jer., 51, 6.

(17) Jo., 14,6.

(18) Mat., 17, 5; Luc., 9,35; Mrc., 9, 6; II Ped., I, 17.

(19) Jo., 8, 12.

(20) Jo., 16, 33.
(21) Estas páginas comovente sobre os dois partidos - o de Jesus Cristo e do Mundo - evocam, em paralelo, a meditação dos dois estandartes, dos Exercícios espirituais. Santo Inácio e São Luís Maria pregam, cada um à sua maneira, a necessidade de tomar partido, ou por Jesus, ou por Satanás, príncipe deste mundo.

(22) Este quadro dos dois partidos é o comentário exato da lição do divino Mestre: “O caminho que conduz à perdição é espaçoso e são numerosos os que nele entram. A via que conduz à vida ... é estreita, e pequeno é o número dos que a encontram” (Mat., VII. 13,14)

(23) Esta palavras dos discíspulos de Jesus são quase todas tiradas dos livros santos. Ver particularmente Rom., 8, 9; Gal., 5, 24; Rom., 7, 29-31; II Cor., 4, 17; Jo., 13, 16; 25, 20; Mat., 20, 16; Luc., 13, 23; Mat., 11, 12; III Tim., 2, 5; I Cor., 9, 24-25.

(24) São Paulo (Rom., 8, 29) estabelece, com efeito, a predestinação dos fiéis na conformidade à imagem do Filho de Deus. Os comentadores modernos o entendem geralmente quanto ao estado de glória; é mistér, entretanto, não esquecer que o estado de glória é o coroamento do estado de graça, e é , para cada um, proporcional a este último.

(25) Os sentimentos dos mundanos aqui revelados foram igualmente tirados da Sagrada Escritura: Is., 22, 13; Jer., 6, 14; 8, 11; Cor., 15, 32; Gen., III, l.

(27) Cf. Is., 1, 2; Fil., 3, 18.

(28) Jo., 6, 68.

(29) I Jo., 2, 12.

(30) Rom., 12, 2 .

(31) Estas palavras resumem o belo capítulo da “Imitação de Cristo” que tem por título: “Do pequeno número dos que amam a Cruz de Jesus Cristo” (liv. II, cap. XI).

(32) Hebr., 12, 2.

(33) II Ped., 1, 4.

(34) Mat., 16, 24; Luc., 9, 23. “Se alguém quiser vir após mim, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e me siga!” A partir deste ponto, tôda a “Carta”é o comentário deste programa de perfeição cristã, proposto pelo Divino Mestre a todos os seus discípulos: convocata turba (Marc. 8, 34) ad omnes ... (Luc., ibid). O parágrafo seguinte nos fornece a divisão deste impressionante comentário.

(35) Esta frase, inédita pelo menos nas edições que vieram até nós, foi extraída das citações da “Carta” feitas por Picot de Clorivière, em sua “Vida de S. Luís Maria Grignion de Montfort”, p. 389.

(36) O pequeno número dos eleitos, de restrição verdadeiramente assustadora, que aqui avalía o santo autor, não lança em o número dos réprobos a imensa multidão dos cristãos menos perfeitos, que a misericórdia divina quer, entretanto, salvar. Segundo o diz o próprio Montfort, trata-se da elite que escolhe o caminho seguro da cruz. O profeta citado (Is. 27, 12) anuncia o reagrupamento dos judeus em sua pátria.

(37) Mat., 13, 11.

(38) II Mac., 1, 3: “De coração largo e de bom grado”.

(39) Sl., 21, 7.

(40) Sl., 39; Hebr., 10, 7-9.

(41) Sl., 39, 9.

(42) Sab., 8, 2.

(43) Luc., 12, 50. - Os comentadores modernos, cercando de mais perto o sentido destas palavras, concordam em ver nelas expressa a angústia do Salvador diante da perspectiva da Paixão. Longe de enfraquecer o pensamento de Montfort, esta interpretação dá-lhe ainda mais força, substituindo ao desejo da cruz a tortura que oprime o seu coração pela visão contínua dessa cruz, que escolheu para nossa salvação.

(44) Heb., 12, 2.

(45) “Não sou como os outros...” são as palavras do fariseu: Luc., 18,2.

(46) Alusão à descrição da mulher forte, de onde foram tiradas estas palavras (Prov., 31, 10-31).

(47) Ef., 3, 18; “A reunião destas 4 dimensões, onde se quis descobrir um gnosticismo cheio de mistério, tem por fim único realçar a magnitude do dom divino” (J. Huby). Montfort, algumas linhas adiante, aplica-as de maneira felicíssima ao dom da cruz.

(48) Gal., 6, 14.

(49)Is., 9, 6.

(50) Tal como deveria fazê-lo, o santo autor deu amplo desenvolvimento a esta parte do seu comentário.

(51) “Quem conhece o poder de tua cólera?” ( Sl., 89, 2).

(52) Jac., 1, 13.

(53) Isto é, que esquecestes por falta de exame.

(54) “No dia do castigo deveremos dar conta de toda palavra ociosa que horvermos dito” (Mat., 12, 36).

(55) “Beberam o cálice do Senhor e se tornaram amigos de Deus”. Este texto, inspirado em várias passagens da escritura, foi tirado do Ofício comum dos Apóstolos, responsório breve da 7ª lição.

(56) V. Fen., 44; 1-14.

(57) Aqui se reconhece o Apóstolo amado, São João Evangelista.

(58) “Podeis beber o cálice que eu beberei?” (Mat., 20, 22; Marc., 10, 38).

(59) Atos, 14, 21.

(60) Prov., 3, 2; Heb., 12, 5-6;  Apoc., 3, 19.

(61) Prov., 3, 2; Heb., 12, 5-6; Apoc., 3, 29.

(62) Ver especialmente o sermão 31, 5-6.

(63) I Cor., 1, 2.

(64) I Cor., 6, 15, 12, 27; Ef., 5, 30.

(65) I Cor., 6, 19.

(66) I Pd., 2, 5 e Ofício da Dedicação das Igrejas.

(67) Mat., 3, 13; Luc., 3, 19.

(68) Deut., 4, 24; 9, 3; Heb., 7, 29.

(69) Ex., 3, 2-3.

(70) Prov., 17, 3; Ecles., 2, 5.

(71) Hebr., 12, 1-2.

(72) Hebr., 12, 2.

(73) Luc., 24, 26.

(74) I Reis, 6, 12.

(75) “Eles o forçaram a carregar a Cruz de Jesus” (Mat., 27, 32; Marc., 15, 21).

(76) “Meu jugo é suave e meu fardo é leve” (Mat., 11, 30).

(77) Comparação tirada de Santo Agostinho (in Sl. 59, 8) e de Santo Agostinho Passim (cf. carta 385, 3).

(78) Ecles., 34, 9.

(79) Nestes dois lindos versos, o missionário poeta conservou muito bem o rítmo da sentença “Quia sine dolore non vivitur in amore” ( Imit. de Cristo, liv. III cap. 5, 7)

(80) Uma bela frase de Soror Isabel da Trindade se aproxima deste pensamento: “Não há madeira como a da cruz para acender na alma do fogo do amor”.

(81) Imit., Liv. I, cap. 15, 11.

(82) Luc., 21, 15.

(83) São João da Cruz foi canonizado posteriormente à época em que viveu o santo autor (NT).

(84) Entre os santos que “usaram de expressões semelhantes” devemos colocar o próprio Montfort, este grande amante da cruz, para quem o maior dos sofrimentos era estar privado de sofrimento, e cuja exclamação “Nenhuma cruz, que cruz!”, proferida num dia de sucesso extraordinário, merece ser acrescentada às belas fórmulas citadas por ele.

(85) “Considerai-vos felizes, meus irmãos, de estar sujeitos a tribulações de toda sorte” (Jac., 1, 2).

(86) Montfort resume aqui as palavras do grande autor oriental em várias de suas homilias e especialmente na  oitava, sobre a Epístola aos Efésios.

(87) Este trecho está transcrito, palavra por palavra, das “Sainctes Voyes de la Croix” (Os santos caminhos da Cruz), de M. Boudon (liv. I, cap. VI).

(88) Fil., 2, 9-10.

(89) Cf. 2; Cor., 4, 17.

(90) Axioma bem conhecido dos antigos, aos quais se refere S. Paulo (Rom., 3, 8).

(91) Marc., 7, 37.

(92) Mat., 15, 14.

(93) (No original: “... des poules mouilées et des chiens morts”).

(94) Sl., 50, 14.

(95) Lc., 11, 13.

(96) Sl., 50, 12.
(97) Sab., 7, 14.

(98) Toda esta alínea é um comentário sobre Tg., 5-6.

(99) I Pd., 5, 6.

(100) I cor., 1, 29.

(101) Num trecho paralelo do “Tratado da verdadeira Devoção à Santíssima Virgem”, Montfort atenuou esta declaração, acrescentando posteriormente esta útil correção: “O pecado de nosso primeiro pai nos deixou a todos quase inteiramente...corrompidos.”

(102) O santo autor desmascara aqui o amor-próprio “que se insinua insensívelmente nas melhores ações” (V. D., nº 146).

(103) Sl., 30, 21.

(104) II Cor., 12, 7.

(105) Cf. At., 8,9.

(106) Isto é: aquelas, dentre as cruzes, que são pequenas e obscuras, se comparadas com as grandes e muito visíveis.

(107) Montfort compôs sobre este tema um belo cântico de vinte e duas estrofes, intitulado “O pobre de espírito”. Os 2º e 4º versos de cada estrofe são, invariavelmente: “Deus seja bendito! Deus seja bendito!” (Cânticos: 19º Tradicional).

(108) Lc., 22, 42.

(109) Sl., 83, 3.

(110) Sl., 107, 2;l Sl., 56, 8.

(111) Isto é, que vos “imputarem”.

(112) Nestas linhas sublimes, em que transparece a santa loucura da Cruz, não julgaríamos estar a ouvir São Francisco de Assis dizendo ao Irmão Leão, diante do quadro dos piores desprezados: “Aí está a perfeita alegria”?

(113) Lc., 16, 15.

(114) Jó., 2, 3.

(115) Montfort, sem dúvida, faz aqui alusão ao extermínio do exército de Senaquerib por um Anjo do Eterno, que dizimou, numa noite, cento e oitenta e cinco mil homens. (IV Reis, 19, 35).

(116) Lc., 21, 18.

(117) II Reis, 16, 5-11.

(118) Sab., 8, 1.

(119) Cf. Itinerário dos clérigos.

(120) Parafr. de Jeremias: Lament., I, 12.

(121) Gal., 3, 1.

(122) I Ped., 4, 1.
(123) Ver. Efes., 6, 12-18.

(124) Heb., 11, 25-26.

(125) Ps., 68, 8; 118, 112.

(126) I Cor., 4, 9 e 13.

(127) Cf. II Cor., 4, 17.

(128) Alusão à defecção do 40º martir de Sebaste.

(129) Escritura e Liturgia, passim.

(130) Cf. Apoc., 2, 6, 11, 17, 26; 3, 5, 12, 21; 21, 7.

(131) Cf. Boudon: “Les sainctes voyes de la croix”, liv IV, cap. VI.

(132) Mat., 21, 21 e 23.





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